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A prestação de cuidados de saúde a pessoas portadoras de doença mental é uma das dimensões do Instituto S. João de Deus que, neste domínio, tem vindo a desenvolver um meritório trabalho na prevenção, diagnóstico e tratamento de problemas mentais, emocionais ou comportamentais. Para melhor conhecermos o trabalho desenvolvido pelo Instituto neste domínio, estivemos à conversa com Vítor Cotovio, Diretor Clínico do Hospital Psiquiátrico Casa de Saúde do Telhal, que nos revelou os principais desafios do presente e futuro da Saúde Mental em Portugal.

Com três centros assistenciais em Portugal Continental dedicados à Saúde Mental – Casa da Saúde do Telhal, Casa de Saúde S. João de Deus, em Barcelos, e Casa de Saúde S. José, em Areias de Vilar – dois nos Açores – Casa de Saúde S. Rafael, em Angra do Heroísmo, e Casa de Saúde S. Miguel, em Ponta Delgada – e um na Madeira – Casa de Saúde S. João de Deus, no Funchal – o Instituto S. João de Deus dá atualmente resposta a solicitações do serviço nacional e regionais de saúde no tratamento de utentes com patologias psiquiátricas de grande complexidade. “A nossa relação com o Serviço Nacional de Saúde é regida através de um acordo com o Estado, subjacente a 1983, que, neste momento, está em fase de revisão”, informa Vítor Cotovio, que explica ainda por qual via chegam grande parte dos utentes aos centros assistenciais do Instituto: “Os serviços de psiquiatria do país fazem uma referenciação destes doentes para que os avaliemos e tentemos perceber, em função dos seus critérios clínicos e do encaminhamento que nos é feito, em que tipologia de unidades e em que características de doentes eles se integram”.

Com a pandemia, o número referenciados agravou-se, fruto da falta de capacidade de resposta dos serviços públicos para estes casos, tornando-se, por isso, urgente a revisão do acordo que rege a relação do Instituto com o Serviço Nacional de Saúde há cerca de 40 anos. “Não é justo que estejamos a receber doentes de maior complexidade e que isso não esteja a ser tido em conta nos programas terapêuticos e nos respetivos pagamentos. As diárias têm de ser revistas e devem ser definidos graus de complexidade para os doentes que nos são encaminhados, de maneira que os próprios pagamentos sejam feitos de acordo com a complexidade dos doentes que nos chegam”, explica.

Saúde mental para todos

Com equipas multidisciplinares e programas de intervenção adequados às necessidades dos utentes, os centros assistenciais do Instituto S. João de Deus são acreditados pelo Sistema EQUASS (European Quality Assurance for Social Service) no âmbito da EPR (European Plataform for Rehabilitation). “Os institutos têm a filosofia de reabilitação psicossocial, que tem como objetivo criar programas de reabilitação, adaptados a cada um, com a finalidade de conseguir que o maior grau de autonomia e de competências não se percam ou sejam readquiridos”.

Apesar de apresentar grande parte dos seus serviços direcionados para os seus utentes, Vítor Cotovio esclarece que a ação do Instituto S. João de Deus não está “fechada sobre si própria” e, por isso, aposta também em projetos direcionados para a comunidade. Neste contexto, importa referir projetos como o “Cuidando” e o “Home 360”, criados com o objetivo de dar respostas comunitárias e contribuir para melhoraria da qualidade de vida das pessoas com problemas de saúde mental e demência.

Criado com o objetivo de promover a empregabilidade das pessoas com doença mental, o “Cuidando” procura ser uma resposta integrada e de proximidade, de intervenção comunitária, direcionada a pessoas com doença mental. “O ‘Cuidando’, para além de dar apoio às pessoas que estão em casa, na identificação da descompensação, na forma de lidar com a doença e na forma de fazer tratamento adequado, de modo a evitar reinternamentos, visa ainda a inclusão social e socioprofissional destes doentes”. Por sua vez, o “Home 360” incide na área das demências, uma das mais carenciadas em Portugal. “O ‘Home 360’ tem como objetivo dar apoio às pessoas com demência e aos seus cuidadores”. Através do apoio personalizado a pessoas com demência e aos seus cuidadores informais, em contexto comunitário/domiciliário e utilizando a metodologia centrada na figura do gestor de caso, “Home 360” pretende, promover a inclusão social, diminuindo as institucionalizações precoces da pessoa com demência e a diminuição da sobrecarga do seu cuidador. “Neste âmbito, estamos a desenvolver uma app direcionada aos cuidadores informais, que não só explica o que são as demências, como também dá dicas e sugestões sobre como lidar com a pessoa ao seu cuidado”.

Prevenção e promoção devem ser alvo de maior investimento

Apesar de todo o trabalho já desenvolvido, Vítor Cotovio não esconde que ainda existem, no âmbito da saúde mental, inúmeros desafios a ultrapassar. A pandemia, o confinamento e os consequentes sentimentos de medo, solidão e angústia, tiveram um impacto muito forte na saúde mental dos portugueses, gerando novos casos de patologia e agravando os que já existiam. Perante esta realidade, urge delinear novas estratégias que atribuam à saúde mental o seu devido valor. “É fundamental que existam cada vez mais programas de prevenção e de literacia, promoção de saúde mental e cada vez mais programas que desmontem o estigma ainda ligado a esta doença. Sinto que é um trabalho que ainda está em desenvolvimento, mas que as pessoas estão cada vez mais implicadas nisso.