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O programa PESSOAS 2030 é um organismo integrado no âmbito do Portugal 2030, onde as pessoas são o centro de toda a atividade. Em entrevista à Mais Magazine, Ana Coelho, Presidente da Comissão Diretiva do PESSOAS 2030, dá-nos a conhecer os principais objetivos do Programa e as expetativas futuras.

Apresente-nos   o   programa   PESSOAS 2030.

O PESSOAS 2030 é um programa do Portugal  2030  que  durante  o  período  de  programação  2021-2027  apoia  medidas  de  política  pública  nas  áreas  da  promoção  do  emprego  de  qualidade,  das  qualificações  e  competências,  da  inclusão social e da privação material, com  um  propósito  maior  de  influenciar  os  processos  de  envelhecimento  demográfico  e  de  promover  o  rejuvenescimento,  daquele  que  é  hoje  o  quinto país mais envelhecido do mundo,  com  perspetivas  a  longo  prazo  de  perda muito significativa de população e,  em  concreto,  de  população  em  idade  ativa.  Numa  frase,  é  um  Programa  que  tem  no  centro  as  pessoas…  todas  as pessoas.

O Programa vem dar continuidade, a outra escala e agora com uma perspetiva mais integrada, ao trabalho que já vinha sendo desenvolvido pelos seus antecessores  no  Portugal  2020:  o  POCH,  o  POISE  e  o  POAPMC,  contribuindo,  através   de   uma   abordagem   multidimensional  e  intersectorial  –  emprego,  qualificações,  inclusão  –  para  colocar  o  País  numa  trajetória  sustentável  de  desenvolvimento económico e social, e em rota de convergência com os melhores exemplos da Europa.

As   áreas   de   atuação   do   PESSOAS   2030  estão  totalmente  alinhadas  com  a  agenda  estratégica  para  o  Fundo  Social  Europeu+  (FSE+)  e  ancoradas  no  Pilar  Europeu  dos  Direitos  Sociais  (PEDS),  cooperando para os macro-objetivos de: aumentar  para  80%  a  taxa  de  emprego  da  população  entre  os  20  e  os  64  anos;  assegurar que pelo menos 60% dos adultos participam anualmente em ações de educação  e  formação;  reduzir  a  taxa  de  jovens  NEET  para  valores  entre  os  7%  e  8%;  reduzir  as  pessoas  em  situação  de  pobreza  ou  exclusão  social  em,  pelo  menos, 765 mil, de entre as quais 161 mil crianças.

Para  este  desígnio,  o  PESSOAS  2030  conta  com  um  investimento  de  6,7  mil  milhões  de  euros  (MM€),  dos  quais  5,7  MM€  são  FSE+  e  cerca  de  1MM€  orçamento   nacional,   concentrado   nas   regiões  NUTS  II  menos  desenvolvidas  de  Portugal  Continental:  Norte,  Centro  e  Alentejo, por serem aquelas onde persistem,  à  escala  infrarregional,  territórios  mais  afetados  pelos  fenómenos  do  desemprego,  das  baixas  qualificações,  dos  défices de literacia, inclusive literacia digital, de pobreza, exclusão social, desencorajamento e afastamento do mercado de trabalho, e por processos acentuados e  progressivos  de  desertificação,  baixa  natalidade  e  envelhecimento  demográfico.

Decorridos 66 anos da criação do FSE, que fez parte da Comunidade Económica Europeia (CEE) desde o seu início, e apesar  do  quanto  o  nosso  mundo  mudou,  o  seu  propósito  original  de  construção  de  uma  Europa  unida  e  coesa  mantém   toda   a   atualidade:   aumentar   a  população  ativa  e  promover  o  acesso  ao  trabalho,  melhorar  as  oportunidades  de   trabalho,   promover   a   mobilidade   geográfica  e  a  mobilidade  no  mercado  de  trabalho,  representando  o  trabalho  digno  o  meio  para  o  pleno  exercício  da  cidadania  e  para  uma  vida  de  qualidade  e de bem-estar.

Quais são as principais áreas abrangidas  pelo  programa?  E  no  que  diz  respeito ao público, a quem se dirige?

Como referido, o PESSOAS 2030 atua sobre as áreas do emprego, qualificações e inclusão, estruturando-se em 56 medidas  de  política  pública  que  se  agrupam  em  torno  de  sete  grandes  prioridades  e  objetivos  específicos:  o  acesso  ao  emprego;  a  conciliação  da  vida  familiar  e  profissional;  o  acesso  à  educação  e  formação; a aprendizagem ao longo da vida; a  inclusão  ativa  e  empregabilidade;  o acesso a serviços de qualidade e o com-bate à privação material.

Na  área  do  emprego,  o  investimento  público  previsto  é  de  900  M€  para  promover o acesso a mais e melhor emprego,  fomentar  o  aumento  da  população  ativa  e  prevenir  situações  de  desencorajamento  e  afastamento  do  mercado  de trabalho, assim como incentivar uma participação mais equilibrada em género no mercado de trabalho.

Apesar  dos  bons  progressos  alcançados  no  funcionamento  do  mercado  de  trabalho,  a  taxa  de  desemprego  jovem  mantém-se   persistente   (23,4%   contra   6,3%  de  taxa  de  desemprego  total),  a  precariedade  no  mercado  de  trabalho  atinge  principalmente  os  jovens,  com  cerca de 53% a serem contratados a ter-mo e com ganhos médios de apenas 68% face  aos  contratos  mais  estáveis,  as  desigualdades  salarias  perseveram  com  as  mulheres a ganhar em média menos 11% do  que  os  homens  e  cerca  de  10%  das  pessoas  com  trabalho  têm  rendimentos  abaixo do limiar de risco de pobreza.

As medidas a apoiar são estágios profissionais,  apoios  à  contratação,  ações  de  capacitação  institucional  de  atores  relevantes   na   definição   das   políticas   ativas  de  emprego,  ações  de  promoção  da  igualdade  de  género  no  trabalho,  de  combate  à  segregação  profissional  e  de  mitigação do gap salarial de género, entre  outras.  Os  principais  destinatários  destes  apoios  são  os  jovens  e  adultos,  nomeadamente,  em  situação  de  desemprego  ou  afastados  do  sistema,  as  famílias, as entidades empregadoras e outras organizações públicas, privadas, do sector social e da sociedade civil.

Na  área  das  Qualificações,  a  dotação  pública  disponível  é  de  4,1  MM€,  dos  quais  3  MM€  destinam-se  à  formação  inicial de jovens e 1,1 M€ à qualificação e requalificação de adultos em idade ativa, empregados ou desempregados.

Nunca  é  de  mais  relembrar  que  44%  da  população  adulta  não  tem  o  ensino  secundário e que nos dias de hoje cerca de  18%  dos  jovens,  dos  20  aos  24  anos,  ainda  entram  no  mercado  de  trabalho  sem  a  escolaridade  obrigatória,  apesar  dos   excelentes   resultados   alcançados   por  Portugal  ao  reduzir,  em  duas  décadas, a taxa de abandono escolar precoce de 45% para 5,9%.

Assim, no caso dos jovens, o PESSOAS 2030  vai  dar  continuidade  ao  investimento  nas  vias  profissionalizantes  de  dupla certificação, destacando-se os cursos profissionais e os cursos de aprendizagem, e ao nível do ensino superior, nas bolsas  de  ação  social  para  estudantes  em  situação  de  maior  desfavorecimento.  Quanto  aos  adultos,  destacam-se  as  oportunidades  flexíveis  de  melhoria  de  competências e de requalificação profissional,  com  enfoque  nas  competências  digitais  e  verdes,  apostando-se  nos  cursos de educação e formação, nas formações  modulares  certificadas,  nos  cursos  de especialização tecnológica e nos Centros  Qualifica.  De  enfocar  ainda  e  com  grande  relevo,  uma  aposta  no  apoio  a  bolsas  de  doutoramento,  em  contexto  académico e não académico.

Na   área   da   Inclusão,   encontra-se   previsto   um   investimento   público   de   1,5  MM€  para  apoiar  a  inclusão  ativa,  a  igualdade  de  oportunidades,  o  acesso  equitativo  a  serviços  de  qualidade,  a  não discriminação por género, condição social  ou  outra,  o  combate  à  privação  material, e a participação ativa de todos os  cidadãos  na  vida  em  sociedade,  prevenindo o risco de pobreza e de exclusão social.

Esta  dimensão  dirige-se,  assim,  aos  grupos mais vulneráveis ou marginalizados – pessoas com deficiência ou incapacidade (PCDI), migrantes, população cigana,  idosos,  crianças  e  desempregados  mais afastados do mercado de trabalho.

Com  uma  taxa  de  risco  de  pobreza  a  rondar os 20% que atinge em particular os  jovens  e  crianças,  bem  como  outros  grupos mais desprotegidos, as medidas a apoiar são muitas e diversificadas, como o  mercado  social  de  emprego,  a  qualificação  e  acesso  ao  mercado  de  trabalho  por  PCDI,  o  modelo  de  apoio  à  vida  independente,  a  aprendizagem  da  língua  portuguesa  para  cidadãos  estrangeiros,  o  apoio  a  organizações  da  sociedade  civil  de  imigrantes,  refugiados  e  pessoas  ciganas,  a  qualificação  do  sistema  de  intervenção precoce na infância, os contratos  locais  de  desenvolvimento  social  e as ações para o envelhecimento ativo e saudável, entre outras.

No  âmbito  deste  programa,  existe  algum  aviso  a  decorrer  brevemente  que gostasse de destacar?

O  PESSOAS  2030  já  lançou  8  Avisos  com uma dotação pública total no valor de 325 M€, destinados a apoiar bolsas de doutoramento,  bolsas  de  ação  social  do  ensino  superior,  programas  de  promoção do sucesso educativo, ações de capacitação dos parceiros sociais, estruturas e respostas de atendimento e de acolhimento  de  vítimas  de  violência  doméstica,  violência  de  género  e  de  tráfico  de  seres humanos.

Foi   recentemente   publicado   o   Plano   Anual de Avisos do PESSOAS 2030, com a previsão  do  lançamento  de  40  Avisos  nos  próximos   12   meses   e   uma   dotação  global   previsional  de  2 MM€,  o  qual  pode  ser  consultado  no  nosso  site.  Este  Plano    é    revisto    quadrimestralmente,  pelo  que  é  expectável  a  aprovação  e  publicitação   de   uma   versão   atualizada ainda em dezembro deste ano.

O objetivo deste Plano e da sua publicitação, é dar a conhecer   ao público em geral o planeamento  estratégico  da  nossa  intervenção,  promovendo,  para  além  da  transparência,  a  capacidade  de  os  beneficiários planificarem  e  melhor  prepararem  o  seu acesso aos apoios.

Depois  dos  excelentes  resultados  alcançados  pelo  PO  CH  e  PO  ISE  no  período de programação 2014-2020, quais são as suas expectativas para este novo programa?

As  expectativas  são  todas.  A  opção  de  reunir  num  só  programa  os  domínios  das  qualificações,  do  emprego  e  da  inclusão  social,  vem  trazer  um  novo  potencial  e  uma  nova  lógica  de  abordagem  às  problemáticas  em  presença  e  sobre  as  quais  o  PESSOAS 2030 assume responsabilidades, para  além  das  naturais  vantagens  do  ponto  de  vista  dos  processos  de  decisão  e  de  gestão sobre política social, às quais se associa uma convicção de maior eficácia nos resultados a alcançar. De referir ainda que estes  domínios  de  intervenção  foram  estrategicamente  desenhados  e  combinados  para  conseguirem  dar  uma  resposta  coordenada à crise demográfica. Efetivamente, a emergência de aportar a dimensão da demografia surge, pela primeira vez, agora no PT  2030,  convocando-nos  a  um  olhar  dedicado  e  dirigido  sobre  uma  temática  que  assume  total  relevância  estratégica  e  de  longo prazo, agora sustentada numa abordagem cruzada de políticas multissetoriais concentradas num instrumento uno.

O  grande  desafio  do  PESSOAS  2030  é  precisamente este, conseguir fazer o pleno uso da oportunidade trazida por esta visão programática  multidimensional  para  atingir os resultados do Programa e contribuir para os objetivos e metas definidos para o País.

O  POCH  e  o  POISE,  apesar  de  se  encontrarem numa trajetória sustentável que faz antecipar o atingimento e até mesmo a superação  dos  seus  objetivos  estratégicos,  ainda  não  terminaram.  De  facto,  esse  é  um dos grandes desafios da Autoridade de Gestão (AG) do PESSOAS 2030: operacionalizar o encerramento dos três Programas do  PT  2020  sobre  os  quais  assumiu  responsabilidades  e  competências  –  POCH,  POISE  e  POAPMC,  o  qual  ocorre  até  ao  primeiro trimestre de 2025 com a entrega à Comissão Europeia de todos os documentos  de  encerramento  e,  simultaneamente,    promover um arranque firme do PESSOAS 2030,  que  tem  um  Plano  de  Avisos  para  o  próximo  ano  bastante  ambicioso,  para além dos avisos que já foram lançados logo desde o mês de março deste ano.

A coexistência de quatro Programas de gestão de fundos comunitários sob a alçada  da  AG  do  PESSOAS  2030,  coloca-nos  pressões   e   oportunidades   de   natureza   diversa.  Desde  logo,  de  natureza  organizacional,  uma  vez  que  implica  a  fusão  de  dois  organismos  –  a  AG  do  POCH  e  a  AG do POISE e do POAPMC. De natureza  procedimental,  uma  vez  que  três  destes  programas  são  financiados  pelo  FSE  e  um  pelo  Fundo  de  Auxílio  Europeu  às  Pessoas  Mais  Carenciadas  (FEAC),  três  são  financiados  ao  abrigo  do  PT  2020  e  um  do  PT  2030,  pelo  que,  tanto  pela  diferenciação  do  fundo  europeu  como  dos  períodos  de  programação,  o  quadro  legal  e  normativo  incorpora  combinações  distintas  e  variadas  de  atuação  e  de  tomada  de  decisão.  E  de  natureza  gestionária,  considerando  que  os  programas  são  diferentes  e  têm  de  ser  geridos  na  preservação dessa diferença – o POCH tem uma dotação de 3,8 MM€ e 7.770 candidaturas aprovadas,  o  POISE  uma  dotação  de  2,6  MM€  e  4.900  candidaturas  aprovadas,  o  POAPMC  uma  dotação  de  208  M€  e  300  candidaturas  aprovadas,  e  o  ainda  jovem  PESSOAS  2030  com  uma  dotação  de  6,7  MM€ -, para além da heterogeneidade de medidas, entidades beneficiárias e modalidades de financiamento.

E em termos futuros, o que podemos esperar do PESSOAS 2030? Dar resposta  a  alguns  dos  maiores  problemas  enfrentados  pelo  país  será  sempre  a  principal causa pela qual se movem?

O  nosso  papel,  o  papel  do  PESSOAS  2030, é apoiar os instrumentos de política pública configurados para retirar o País de uma  posição  de  fragilidade  estrutural  em  três  dimensões:  o  défice  de  qualificação  dos  portugueses,  o  défice  de  competitividade da economia e o défice de coesão social e territorial.

Estes  três  défices  estruturais  alimentam-se num ciclo perpétuo de baixas qualificações e competências – baixa produtividade – fraca competitividade da economia – baixos salários, desemprego e fenómenos de  pobreza  e  exclusão  social  –  baixa  natalidade  –  diminuição  da  população  ativa  e envelhecimento demográfico – estrangula mento  do  funcionamento  do  mercado  de  trabalho -, que é urgente interromper.

A aceleração das transformações de contexto dos últimos anos – saúde, volatilidade geopolítica,  ordem  económica  internacional,  digitalização,  automação,  inteligência  artificial,  cibersegurança  -,  aliadas  a  pressões  sociais,  demográficas  e  ambientais,  tem vindo a aprofundar ainda mais as distorções no funcionamento do mercado de trabalho, reclamando especial atenção das políticas públicas.

A missão do PESSOAS 2030 atua precisamente no âmago desta sucessão negativa aliada a este contexto transformativo, acelerado e incerto. Resolver o défice de qualificações  e  de  competências,  promover  a  conciliação entre a vida profissional e pessoal, incentivar a natalidade, a imigração, o envelhecimento ativo, a inclusão social de todos, combater a inatividade, estimular o emprego de qualidade para alimentar uma economia  mais  robusta  e  dinâmica  e  criar  condições  para  atrair  e  reter  talento,  são  certamente   sementes   de   transformação   que transportam a promessa de um Portugal mais justo, mais inclusivo, mais próspero e refletem o compromisso coletivo para construir   uma   sociedade   onde   TODOS   têm um lugar.