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Porto de abrigo dos navegadores portugueses nas grandes viagens dos Descobrimentos, Angra tem o seu nome e o seu “heroísmo” gravados na história de Portugal. Detentora de um património paisagístico e arquitetónico únicos, a cidade “Centro do Mundo” é, desde 1983, Património da Humanidade. No ano em que se assinala o 40.º aniversário desta distinção, José Álamo Meneses, Presidente do Município, esteve à conversa com a Mais Magazine e deu a conhecer um pouco melhor a importância que esta classificação tem para a cidade e para a preservação da identidade das suas gentes.

Não há nada melhor do que percorrer o nosso belo país e descobrir os seus recantos, encantos e singularidades. Cada viagem é uma descoberta e nesta convidamo-lo a rumar até ao arquipélago dos Açores, mais concretamente até à ilha Terceira, onde se ergue a majestosa cidade de Angra do Heroísmo. Com o seu nome gravado na história de Portugal, a cidade açoriana foi, entre os séculos XV e XVI, um porto de escala obrigatória das frotas de África e das Índias, centrado na prestação de serviços de reabastecimento e reaparelhamento das embarcações carregadas de mercadorias e valores. Assim, foi em grande parte a partir do seu porto, o único natural e com alguma dimensão existente no arquipélago, que a povoação angrense se desenvolveu, tendo sido, em 1534, a primeira do arquipélago a ser elevada à condição de cidade.

Angra do Heroísmo – Património da Humanidade há 40 anos
Entreposto de gentes, gostos e culturas das carreiras dos Descobrimentos, na cidade de Angra do Heroísmo estão vinculadas as marcas de um tempo que ainda hoje é percetível, sendo uma referência cultural e histórica. Detentora de um património único do ponto de vista arquitetónico e paisagístico, Angra do Heroísmo está classificada como Património Mundial pela UNESCO, desde 1983, tendo sido a primeira cidade portuguesa a obter este título. José Álamo Meneses reconhece que a história de Portugal que, muitas vezes, teve Angra do Heroísmo como epicentro, deram ao Património Mundial da Humanidade um contributo meritório que se veio a traduzir no seu inevitável reconhecimento universal. “Esta é uma classificação que se funda, essencialmente, no papel histórico da cidade enquanto ponto essencial na ligação entre a Europa e os novos mundos que foram sendo abertos com a expansão europeia. Ao contrário do que acontece na grande maioria dos casos, em que é classificado um determinado edifício ou monumento pelo seu valor estético, ou histórico, em Angra do Heroísmo está classificado um conjunto, uma parte da cidade que corresponde à zona que esteve expressamente envolvida neste papel de ‘base naval’”. E é exatamente aqui que reside a sua singularidade.



Património Cultural, memória e identidade
O património cultural assume uma importância vital na preservação da memória dos povos. É ele o reflexo da nossa história e um dos maiores estandartes da nossa identidade. A classificação do centro histórico de Angra do Heroísmo, em 1983, veio não só reconhecer a sua longa história e património, mas também dar a esta cidade e à força do seu povo um reconhecimento e projeção internacional únicos. “Esta classificação veio colocar Angra do Heroísmo num ‘clube’ que tem, obviamente, uma grande importância a nível planetário. Angra do Heroísmo ainda hoje é, no contexto global, uma cidade pequena, com cerca de 12 mil pessoas. A verdade é que, por ser uma cidade incluída na lista de património mundial, ganhou uma projeção internacional e presença num conjunto de organismos que nunca ganharia por qualquer outro fator”, afirma José Álamo Meneses. Para além disso, importa destacar que esta classificação surge apenas três anos depois de Angra do Heroísmo ter visto cerca de 80% do seu património ser destruído por um terramoto, em janeiro de 1980. Esta classificação veio assim, não só, reconhecer o exemplar trabalho de reconstrução desenvolvido, mas também devolver a autoestima à população angrense. “Angra do Heroísmo foi classificada, em 1983, num dos momentos mais críticos da sua história. Esta classificação e este aumento da autoestima foi fundamental para termos a cidade que temos hoje. Graças a esta classificação Angra renasceu, verdadeiramente, não das cinzas, mas das ruínas.”

Centro histórico é joia da coroa de Angra do Heroísmo
Ser cidade “Património Mundial” é motivo de grande orgulho. No entanto, uma cidade só poderá receber o título de Património Mundial se cumprir pelo menos um dos seis rigorosos critérios gerais da UNESCO. Curiosamente, o centro histórico de Angra do Heroísmo cumpre não um, mas dois critérios. Enquanto escala obrigatória das frotas das Áfricas e das Índias em pleno oceano Atlântico, o porto de Angra é o exemplo iminente de uma conceção ligada à função marítima, no quadro das grandes explorações. A somar a isso, Angra do Heroísmo está direta e materialmente associada a um acontecimento, de significação histórica universal: a exploração marítima que permitiu o intercâmbio entre as grandes civilizações do planeta. Mas afinal o que podemos encontrar na área da cidade distinguida como “Património Mundial”?

Do centro histórico de Angra do Heroísmo fazem parte monumentos e edifícios de reconhecida beleza e valor histórico, como igrejas, palácios, conventos, museus e fortalezas de um urbanismo singular. “A primeira caraterística do centro histórico de Angra do Heroísmo é o facto de ser um dos primeiros espaços urbanos planeados existentes a nível europeu. Os edifícios têm todos o mesmo tipo de fachada, o mesmo tipo de altura, o mesmo alinhamento”, adianta o Presidente do Município.



A história de Angra do Heroísmo e do seu centro histórico é ainda contada pelos seus monumentos e pelos tesouros que guarda há vários séculos. Um deles é o Castelo de São João Batista. Considerada a maior fortaleza da bacia do Atlântico e com uma extensão de cinco quilómetros, esta imponente estrutura que domina a paisagem urbana da cidade foi construída em 1591. Na malha urbana da cidade alguns dos destaques vão para a Sé Catedral, considerada a maior igreja de todo o arquipélago dos Açores e um dos melhores exemplares do trabalho de reconstrução desenvolvido no período pós-terramoto. “Temos ainda, entre muitos outros pontos de interesse, o Palácio dos Capitães-Generais, o maior colégio jesuíta construído nas zonas de expansão portuguesa e que teve um papel extremamente importante na formação de missionários destinados ao extremo Oriente, e a Casa do Provedor das Armadas, localizada na parte alta da cidade e que é um edifício de grande monumentalidade.”

Município assume compromisso com a preservação e valorização deste legado
O património histórico e cultural não só faz parte dos bens inestimáveis e insubstituíveis de cada região, mas de toda a humanidade. Por isso, a sua proteção e valorização é imprescindível. No caso da zona classificada de Angra do Heroísmo esse compromisso é assumido pela Direção da Cultura em parceria com a Câmara Municipal de Angra do Heroísmo, que tem desenvolvido importantes medidas com vista à preservação e valorização deste património que é de todos. “O facto de termos a zona central da cidade classificada implica um grande conjunto de restrições, quer do ponto de vista da construção, quer da própria utilização do espaço. Não podemos, por exemplo, fazer casas novas ou deitar abaixo aquilo que está velho, como acontece noutras cidades. Aqui, a regeneração urbana implica necessariamente a reutilização dos espaços de forma a manter essa genuinidade. Por outro lado, temos, simultaneamente, que manter a qualidade do património construído. Angra é uma cidade viva o que, necessariamente, implica que tenhamos de conciliar as necessidades de uma sociedade moderna, com a genuinidade da cidade. Temos de garantir a vitalidade, a modernidade e atratividade da cidade, mas sem nunca comprometer este legado histórico”, explica José Álamo Meneses.

Considerada o ex-líbris da Ilha Terceira, a zona classificada de Angra do Heroísmo é ponto de visita obrigatória para milhares de turistas nacionais e estrangeiros que ao longo de todo o ano visitam a ilha. Consciente desta realidade, o Município de Angra do Heroísmo tem apostado no desenvolvimento de diversas iniciativas com o intuito de promover a dinamização turística do seu centro histórico, mas também de dar a conhecer este “Património Mundial” a quem deseje visitar a cidade. “Temos tirado um grande partido da existência desta classificação na promoção do concelho, mas também de toda a ilha e até do arquipélago. Esta ação tem sido extremamente proveitosa não só para o Município, como também para própria Câmara do Comércio e para as entidades ligadas ao Turismo”, explica.



Não restam dúvidas de que Angra do Heroísmo é uma das mais importantes cidades históricas de Portugal. Com um riquíssimo arquivo cultural, religioso e civil, a cidade encanta quem a visita. Dependendo da sua idade e gosto, José Álamo Meneses deixa-lhe sugestões de dois programas para um dia bem passado na cidade açoriana: “Para quem tem um interesse mais centrado na vertente cultural, convido a cá vir fora da época de verão, numa altura em que a cidade está mais calma e sossegada. Desafio-vos a ver a cidade, percorrer as suas ruas e contemplar os seus monumentos, sempre acompanhados de uma boa literatura que permita entender a história das coisas. E neste programa há dois pontos que são de visita obrigatória: a Memória e o Monte Brasil. Para quem deseje maior atividade e interação, nada melhor que vir na altura do verão, se possível durante as Sanjoaninas, um festival histórico com mais de 500 anos, que todos os anos movimenta dezenas de milhares de pessoas. Não poderia também deixar de vos convidar a participar nas nossas touradas de rua, que apelam sobretudo ao convívio”. Quer procure um programa mais cultural ou um mais festivo saiba que quando aqui chegar terá sempre uma cidade de braços abertos à sua espera.


Festas do Divino Espírito Santo a Património Imaterial da UNESCO

Desde 1983 que Angra do Heroísmo é classificada como Património Mundial da UNESCO. No entanto, esta distinção pode não ser a única, uma vez que os Municípios de Angra do Heroísmo, Ponta Delgada e Alenquer estão a trabalhar na criação de uma associação intermunicipal das Festas do Divino Espírito Santo para preparar uma candidatura a Património Mundial Imaterial da UNESCO. As celebrações ligadas ao Divino Espírito Santo são um dos traços mais marcantes da identidade açoriana, constituindo um culto milenar que, para além de marcar o quotidiano insular, determina traços identitários dos açorianos.