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“Se o século XX foi o século da rodovia, o século XXI é, claramente, o século da ferrovia. É o século em que a ferrovia se vai tornar o pilar da mobilidade nacional”, afirma João Figueiredo, Presidente da Plataforma Ferroviária Portuguesa em entrevista à Mais Magazine.

Criada em 2015, a Plataforma Ferroviária Portuguesa (PFP) agrega, atualmente, um universo de mais de 100 associados, reunindo os principais stakeholders do setor ferroviário nacional na busca por um objetivo comum: tornar Portugal uma referência internacional no setor ferroviário e um local privilegiado para o desenvolvimento de projetos de investigação e inovação. “Pretendemos mostrar que, nacional e internacionalmente, temos capacidade para investigar e desenvolver novas soluções para o mercado ferroviário”, afirma João Figueiredo. Com vista a atingir estes objetivos e a captar cada vez mais investimento para este setor, a PFP assume como uma das estratégias reunir no novo Centro de Competências Ferroviário as principais atividades de investigação, desenvolvimento e inovação do setor ferroviário em Portugal. “No Centro de Competências já existe uma escola de formação, mas estão a ser preparadas obras para que no local possa vir a existir um Centro de Incubação de Empresas, laboratórios de investigação, mas também serviços de consultoria e de certificação do setor”, afirma João Figueiredo.

Portugal quer apanhar comboio do investimento
Após vários anos em que a ferrovia não evolui como se esperava, a PFP anunciou que Portugal quer finalmente voltar a captar investimento industrial, acreditando que o país tem condições únicas para recuperar décadas de desinvestimento nos comboios. “Nos últimos anos conseguimos reverter esta tendência de desinvestimento, desde logo, com o significativo investimento em infraestruturas, que se iniciou com o Programa Ferrovia 2020. Por outro lado, temos também aprovado o Programa Nacional de Investimentos 2030, que prevê investir cerca de 10 mil milhões de euros em infraestruturas ferroviárias, tendo como prioridade a melhoria do transporte de passageiros, com claro destaque para o Projeto de Alta Velocidade Lisboa-Porto-Vigo”. Sendo ainda de assinalar, neste contexto, o concurso lançado pela CP para aquisição de material circulante, num valor superior a 800 milhões de euros. “Estes avultadíssimos investimentos vão criar um aumento exponencial da procura pelo transporte ferroviário nos próximos anos, levando à necessidade de serem adquiridos novos comboios. No entanto, não existe no setor capacidade instalada para fazer face a este previsível aumento de procura pelo que fará sentido que os novos comboios que Portugal necessite venham a ser produzidos em território nacional, com trabalhadores e fornecedores portugueses. O que poderá ter um impacto para a economia portuguesa e, certamente, para o setor, semelhante ao que a Autoeuropa teve para o setor automóvel há 30 anos”, afirma.

Redução da pegada carbónica: um desígnio nacional
Estima-se que, atualmente, cerca de 89% das deslocações de pessoas são efetuadas por via rodoviária. Perante esta realidade, João Figueiredo já expressou o desejo da PFP de contribuir para baixar, significativamente, esta percentagem nos próximos anos, não deixando de alertar que este deve ser um desígnio nacional. “Um dos maiores desafios do país é baixar a quota modal do transporte rodoviário. Se o país quer atingir as metas de descarbonização a que se propôs, tem mesmo de reduzir a utilização do transporte rodoviário”, alerta. Neste contexto, importa ressalvar que, atualmente, o setor dos transportes representa cerca de ¼ dos gases com efeitos de estufa emitidos por Portugal. A ferrovia, por seu torno, representa menos de 0,5% das emissões em toda a Europa. Hoje, feitas as contas, um comboio de passageiros retira cerca de 850 carros da estrada, enquanto que um comboio de mercadorias pode retirar 50 camiões. “O novo Plano Ferroviário Nacional define como objetivo que a ferrovia atinja em 2050 uma quota modal de 40% no transporte de passageiros e de 20% no transporte de mercadorias. No entanto, para o transporte ferroviário ser eficiente e ter esta capacidade de atrair passageiros, diminuindo assim o transporte rodoviário, ele tem de ser complementado com outros modos transporte, de forma integrada”. Para João Figueiredo torna-se assim indispensável a criação de soluções intermodais que integrem os vários intervenientes do setor ferroviário português. “Só de forma colaborativa, consertada e em rede é possível atingir estas metas”.

Plano Ferroviário Nacional
O Plano Ferroviário Nacional (PFN) é o instrumento que irá definir a rede ferroviária que assegura as comunicações de interesse nacional e internacional em Portugal. “O Plano Ferroviário Nacional é importantíssimo, porque definirá o futuro da evolução de rede ferroviária portuguesa, tornando-se um instrumento de gestão do território, assegurando que no futuro será possível garantir os canais que agora ficam definidos para as novas ligações ferroviárias. Por outro lado, o PFN dará ao setor previsibilidade de evolução da rede, clarificando os locais e, sobretudo, acabando com as discussões de décadas sobre hipotéticos traçados, em que o país tem feito enormes investimentos em estudos e mais estudos, mas que na sua generalidade acabam por não ser concretizados”, explica. Assim, à semelhança do que aconteceu com o Plano Rodoviário Nacional no século XX, espera-se que o PFN norteie os investimentos ferroviários necessários para alcançar as metas a que Portugal se propõe. “Se o século XX foi o século da rodovia, o século XXI é, claramente, o século da ferrovia. É o século em que a ferrovia se vai tornar o pilar da mobilidade nacional. Tenho a certeza que Portugal vai, finalmente, entrar ‘nos carris’”.