O Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (ISEL) lançou, em parceria com a Infraestruturas de Portugal, uma Pós-Graduação em “Especialização em Engenharia Ferroviária”, que pretende responder às necessidades do país em técnicos qualificados na área ferroviária. Alexandra Costa, membro da Comissão Coordenadora, deu a conhecer à Mais Magazine o contributo dado por esta instituição de Ensino Superior à alavancagem e desenvolvimento do setor ferroviário português.
As raízes do ISEL remontam ao ano de 1852, com a criação do Instituto Industrial de Lisboa. Passou a Instituto Superior de Engenharia de Lisboa no pós-25 de abril, em dezembro de 1974, e, em outubro de 1988, foi integrado no Instituto Politécnico de Lisboa. Desde então, tem-se afigurado uma instituição de referência na criação, transmissão e difusão da ciência, tecnologia e cultura, bem como na promoção da excelência no Ensino Superior em engenharia e na investigação científica. Com uma oferta formativa orientada para as necessidades do país, contribuindo assim para o desenvolvimento qualificado, integrado e harmónico da educação superior em Portugal, o ISEL oferecia até 2021 11 Licenciaturas, dez Mestrados e duas Pós-Graduações. “Os nossos cursos têm a preocupação constante de atualizar os seus conteúdos em função do desenvolvimento tecnológico e das necessidades do mercado. Atualmente, temos mais de 300 parcerias com instituições e empresas dos mais variados setores, onde são levados a cabo projetos aplicados de Investigação e Desenvolvimento (I&D), estágios e teses que possibilitam a criação de profissionais de elevada competência e grande potencial na resolução de problemas do tecido industrial e empresarial”, afirma Alexandra Costa. Este ano, a instituição deu mais um importante passo na diversificação da sua oferta formativa com a Licenciatura em Engenharia Física Aplicada, o Mestrado em Matemática Aplicada para a Indústria e sete novas Pós-Graduações, das quais se destaca a Pós-Graduação “Especialização em Engenharia Ferroviária” (PG-EEF).
PG-EEF dá resposta à necessidade de técnicos qualificados
Reconhecendo a falta de recursos técnicos de engenharia especializados na área ferroviária, preparados para atender às necessidades imediatas do mercado de trabalho a par da escassez de formação especializada na área, o ISEL criou a PG-EEF, em parceria com a Infraestruturas de Portugal, com o objetivo de responder às necessidades do país em técnicos qualificados na área ferroviária. “A importância que este setor recentemente adquiriu veio corroborar a estratégia seguida por docentes do ISEL, que apostaram na inovação no domínio das tecnologias de comunicação e sinalização ferroviárias. O reconhecimento do setor no trabalho desenvolvido e, mais recentemente, a forte adesão à PG-EEF são prova disso mesmo”, assume Alexandra Costa. Com uma forte vertente prática, a PG-EEF destaca-se por formar profissionais flexíveis, com uma visão global e de pormenor nas diferentes vertentes da Engenharia Ferroviária, sem descurar os conceitos básicos, fundamentais para a inovação e para as transições ecológica e digital. “A PG-EEF permite a aquisição de elevadas competências técnicas a par de capacidades de integração e liderança em equipas multidisciplinares, sejam equipas de projetistas, fiscalizações, empreiteiros ou da própria IP. É toda uma nova geração de engenheiros, capazes de superar os novos desafios, incrementando a valorização da engenharia e indústria nacionais, e recuperando a nossa capacidade de produção”.
“Sem qualificação, não haverá modernização”
Depois de um longo período em que a ferrovia pareceu estar esquecida, Portugal finalmente começa a querer apanhar o “comboio do investimento”, estando prevista a aplicação de milhões de euros na ferrovia. Numa altura em que tanto se fala de “investimento” Alexandra Costa defende a necessidade urgente de se investir na formação de profissionais qualificados que possam dar resposta a um setor em constante modernização. “A CP foi durante muitas décadas a universidade que formou os engenheiros dedicados ao caminho-de-ferro. Porém, nas últimas três décadas, esse papel foi sendo reduzido de forma expressiva, em parte devido às sucessivas reorganizações do setor público ferroviário, quantas vezes resumidas a reduções estruturais e ao desaparecimento dos organismos de formação. Por outro lado, entre 2010 e 2017, o desenvolvimento do setor ferroviário português foi praticamente nulo, circunstância que esteve na origem de uma significativa “desativação” do setor privado dedicado à ferrovia”. Como consequência, atualmente, em Portugal verifica-se uma descapitalização generalizada de competências técnicas no domínio ferroviário, transversal a todo o setor e que abrange donos de obra, empreiteiros, projetistas e empresas de fiscalização. “Parece-nos, portanto, inequívoco que, face aos desafios decorrentes da necessidade de concretização do PNI 15-20 (que se estima até final de 2023) e do PNI 20-30 (que, realisticamente, deverá acontecer no horizonte 2023-2030), é urgente que se invista na formação de profissionais qualificados que possam dar resposta a um setor tão importante quanto francamente deficitário. Sem qualificação, não haverá modernização”.
ISEL lidera investigação na área das comunicações ferroviárias
A Investigação (I&D) é uma das facetas mais marcantes do ISEL, que na área da ferrovia tem uma forte componente na área das comunicações ferroviárias. Desde o início da digitalização das comunicações móveis ferroviárias em Portugal, o ISEL esteve diretamente envolvido na criação das primeiras redes GSM-R. “Estes projetos iniciaram-se ainda no tempo da Refer Telecom, com a rede piloto da Linha de Cascais, em 2008”, recorda Alexandra Costa. A investigação então levada a cabo, liderada por docentes da área das Telecomunicações e Computadores, foi distinguida em diversas conferências científicas internacionais e constituiu a base para a criação de um núcleo de conhecimento nesta área, único no país, que desde então acompanha o desenvolvimento das comunicações ferroviárias no país. “É um exemplo em que a investigação e inovação, desenvolvida no ISEL em torno das redes de comunicações críticas, foram aplicadas a metodologias em engenharia que se traduziram na poupança efetiva de recursos nacionais, no aumento de eficiência das redes instaladas e na criação de valor na engenharia portuguesa. Foi, aliás, no seguimento desse trabalho que o ISEL integrou, desde a primeira hora, a Plataforma Ferroviária Portuguesa”, explica.
Ferrovia 4.0
No âmbito da investigação desenvolvida pela instituição, importa destacar que o ISEL integra o projeto mobilizador Ferrovia 4.0, que pretende endereçar os desafios tecnológicos e de mercado que se têm colocado ao setor ferroviário. “O ISEL integrou o núcleo reduzido de instituições que pensaram e promoveram a candidatura ao projeto mobilizador. O nosso trabalho está focado na área das comunicações, sensorização de via e processamento de dados para manutenção e segurança. O projeto tem permitido o desenvolvimento de novos produtos e serviços na área ferroviária, um setor extremamente conservador no que respeita à aplicação de tecnologia, devido aos elevados padrões de segurança a que as normas internacionais obrigam”, explica. A criação de produtos inovadores e novas abordagens permitirá que, findo o projeto, as empresas parceiras que integram o consórcio estejam dotadas de tecnologia e produtos que possam colocar no mercado, conseguindo assim responder às grandes oportunidades do setor. “Este projeto permitirá alavancar a integração de tecnologia e engenharia nacionais, reduzindo a dependência externa que atualmente se verifica. É também um excelente exemplo da transferência de conhecimento entre a academia e a indústria”.
ISEL continuará a responder aos desafios da ferrovia portuguesa
Ignorada durante décadas, a ferrovia portuguesa tornou-se obsoleta. No entanto, Portugal parece estar a apanhar o “comboio do investimento” e os caminhos de ferro portugueses serão nos próximos anos alvo do maior investimento estruturado de que há memória. Com a Ferrovia 2020 ainda a decorrer, mas com o PNI 2030 já a entrar em andamento, Alexandra Costa não nega que o setor ferroviário português tem ainda alguns desafios pela frente: “Os grandes desafios do setor ferroviário, a curto/médio prazo, são a conclusão do PNI 15-20, com um conjunto de obras/ projetos em curso, e a execução do PNI 2030. O PNI 2030 é um plano muito ambicioso, no qual se destaca a construção da Linha de Alta Velocidade Lisboa-Porto”. Espera-se que o projeto integre as ligações necessárias ao (novo) aeroporto de Lisboa e ao aeroporto do Porto e está ainda prevista uma nova linha que ligará Porto a Vigo.
Da parte do ISEL fica a garantia de continuar, como até então, a contribuir para alavancar e desenvolver este setor em Portugal. “As duas primeiras edições da PG-EEF (com a 2ª edição a ter início já nos primeiros dias de janeiro) permitirão a formação qualificada de mais de 50 técnicos até ao final de 2023. E as próximas edições da PG-EEF já irão contar novos módulos dedicados à “Alta Velocidade”, nas suas vertentes de projeto, construção, fiscalização e manutenção. A resposta do ISEL é, portanto, inequívoca e determinada: iremos continuar a contribuir com a nossa investigação e na formação de profissionais especializados e altamente qualificados”.