Novembro – o nome deste mês parece carregar o mundo com ele. Há uma musicalidade nesta palavra, em várias línguas, que nos remete para uma melancolia triste mas irresistivelmente sedutora. Talvez seja só o processo necessário para alcançar a lucidez desejada, ou a influência de estar a ouvir o épico “November” de Max Richter enquanto escrevo este editorial.
Em novembro é assim, aproxima-se o inverno, esquecemos a seca do ano inteiro à força de chuvadas e tempestades. E este inverno promete ser particularmente frio, não tanto pelo clima, mas por causa dos aumentos dos custos da energia e da inflação generalizada. De uma forma menos denotativa, este “frio”, misto de incerteza e angústia, só nos deixa como alternativa lutar contra os efeitos dele nas nossas vidas. Uma boa forma de o fazer, até de forma literal, é pegar num cartucho de castanhas assadas, não fosse hoje dia de S. Martinho, e passear pelas ruas cheias de gente.
Será ainda cedo para dizer que já cheira a Natal? Iluminações já há e, passado o Halloween com os seu morcegos e bruxas, as montras também começam a enfeitar-se cada vez mais a preceito. Isto porque em Portugal qualquer altura é boa para falar de bacalhau, mas esta é especial e temos, por isso, muitas páginas dedicadas a este peixe que faz parte da nossa História.
E faz parte também das nossas memórias à mesa, de noites geladas de consoada com as travessas a fumegar. A neve lá fora e o nosso corpo aconchegado cá dentro pelo carinho das mãos que partem as batatas, que lavam as couves e que servem o bacalhau. Tantos processos para ali chegar àquele momento – pescado lá longe, seco, salgado, demolhado, escolhido… cozinhado. Nunca perderei o tremendo respeito pela meticulosidade do trabalho bem feito. Mas falo mesmo daquele respeito que nos faz ficar um pouco em silêncio contemplativo – sem necessidade de acrescentar nada, para não estragar.
Importa ainda dizer que esta edição não fala apenas de bacalhau. Temos tecnologia, indústria, e até saúde – com enfoque na saúde mental. Um tema cada vez menos invisível, tão sensível e relevante que tem necessariamente de ser tratado com todo o cuidado. Muito importante determo-nos então nas palavras do coordenador nacional das Políticas de Saúde Mental, Miguel Xavier, quando aponta a necessidade de intervir nas “condições socioeconómicas” para “melhorar a saúde mental global de uma população”.
Temos mesmo de vencer o frio, com música, poesia, abraços, castanhas assadas, bacalhau a fumegar… e casas aquecidas.