Explorar a beleza do Alentejo é sinónimo de aventurar-se por uma região marcada pelas suas caraterísticas planícies que se perdem no horizonte, pela gastronomia local e vinhos excelência, pelos inúmeros sobreiros que compõe a paisagem e pelas gentes alentejanas e a sua singular forma de bem receber por quem lá passa. Em entrevista à Mais Magazine, José Manuel Santos, Presidente da Turismo do Alentejo -ERT, abordou o trabalho que tem sido desenvolvido no sentido de promover a região e sobre as inúmeras potencialidades que o Alentejo tem para oferecer.
Comece por nos falar sobre si e sobre o seu trajeto profissional. Qual o papel que já desempenhou na promoção do turismo no Alentejo ao longo dos anos? Qual o significado de dirigir esta entidade?
Trabalho no turismo do Alentejo há quase trinta anos, a maior parte do tempo em funções dirigentes. Ter chegado a Presidente da Entidade Regional de Turismo é, para mim, de certa forma, o culminar desse percurso e traduz também o resultado de um reconhecimento do território e dos seus agentes pelo trabalho que desenvolvi e pela dedicação que sempre tive para com esta atividade fantástica que é o turismo. Tive ao longo destes anos, felizmente, a oportunidade de participar na conceção e execução de vários programas e projetos que creio foram marcantes para o desenvolvimento do turismo no Alentejo. O início do trabalho em 1996 foi muito interessante, dada a polivalência das funções. Era técnico do gabinete de apoio ao investidor, elaborava candidaturas e recebia os jornalistas e tour operadores internacionais. Recordo esses tempos com muita saudade. Dirigir hoje esta entidade regional de turismo, depois de todo o trabalho que realizei na instituição, é ainda mais gratificante e desafiante.
Qual a missão/objetivos da Turismo do Alentejo?
A nossa missão é a de afirmar, turisticamente, o território e promovê-lo junto dos potenciais turistas, valorizando, sob o ponto de vista económico, os recursos identitários, históricos, culturais e ambientais da região. Essa missão está, intrinsecamente, ligada e não perde de vista uma dimensão de desenvolvimento económico, social e cultural do território. Temos, claramente, um objetivo que é o da Turismo contribuir para a coesão social e territorial, para o emprego e para a melhoria da qualidade de vida dos que aqui residem. Os stakeholders do setor – sejam eles públicos ou privados – esperam, no entanto, hoje da nossa Entidade Regional de Turismo respostas cada vez mais abrangentes e dimensionadas à escala regional, mas, ao mesmo tempo, exigem medidas e ações focadas nos seus problemas específicos e nos microterritórios e locais onde operam. A capacidade produtiva instalada do setor na região tem crescido, fixaram-se novas competências e a notoriedade crescente do destino abriu portas a novos investimentos. Tudo isto trouxe novos desafios que requerem, a meu ver, respostas renovadas das instituições públicas e, acredito, também uma nova atitude de liderança de quem pretende gerir o destino. Mesmo a parte mais tradicional da missão das entidades regionais de turismo – refiro-me à estruturação da oferta e à promoção – tem de ser repensada. Isto para não falar dos outros desafios estruturais, ligados à sustentabilidade, à monitorização do destino, à adaptação da oferta, às alterações climáticas e à sua governança. Estamos prontos para esse desafio.
Há alguns anos, o Algarve era a zona predileta das famílias portuguesas e estrangeiras para passar as suas férias de verão. No entanto, principalmente no pós-pandemia, as pessoas começaram a procurar outros destinos de férias e que predileta das famílias portuguesas e estrangeiras para passar as suas férias de verão. No entanto, principalmente no pós-pandemia, as pessoas começaram a procurar outros destinos de férias e que apresentassem uma oferta turística diferenciada. Atualmente, pode-se afirmar que a região do Alentejo é cada vez mais procurada pelos turistas e é um epicentro turístico de grande relevo?
Acredito que o Alentejo é, cada vez mais, um destino familiar para os portugueses. É verdade que o Algarve tem mais do dobro de dormidas de portugueses do que o Alentejo, mas nós estamos, em termos relativos, a crescer mais do que a média nacional neste segmento específico da procura. Em 2022 crescemos na procura interna 8.6%, ligeiramente, acima da média nacional. Em boa parte da segunda década deste novo século também foi assim. Sei que este verão o Alentejo conquistou alguns clientes que, normalmente, faziam férias no Algarve. Isso é bom, mostra um destino e empresários competitivos. Por outro lado, antes da pandemia, o peso das dormidas dos não estrangeiros era de cerca de 34% do total das pernoitas. A procura externa está a recuperar, mas é importante que a dinâmica da internacionalização se estenda a toda a região e não fique concentrada só em alguns polos. Mas há ainda muito espaço para crescer. As taxas de ocupação têm subido, mas ainda estamos longe dos níveis dos outros destinos portugueses mais maduros. Queremos crescer, é por isso que temos de ser mais ambiciosos na nossa ação.
Que tipo de iniciativas/programas a sua entidade promove tendo em vista a promoção do turismo na região?
O Alentejo tem apostado muito nos últimos dez anos em campanhas motivacionais, cujo objetivo foi o de trabalhar o posicionamento estratégico do destino e o reforço da notoriedade da marca. Creio que agora faz mais sentido optar por campanhas de cariz tático, em épocas específicas do ano. Aliás, estamos, precisamente, nesta altura a ultimar uma campanha para o outono/inverno que irá sair no início de outubro e cujo objetivo é o de chamar a atenção dos portugueses para os produtos e experiências que o destino tem para oferecer no pós-verão. Na área digital vamos ter de ser mais estáveis e consistentes. Em função dos recursos financeiros que conseguirmos mobilizar, nomeadamente, junto dos Fundos Estruturais no Alentejo, iremos definir um plano de ação para elevar o desempenho do nosso ecossistema digital de promoção turística. Queremos, igualmente, reestruturar a nossa rede de embaixadores, que é uma figura importante do nosso marketing, mas que tem de ser repensada. A partir do próximo ano queremos ser mais agressivos no âmbito da promoção, estimulando as empresas a apresentarem candidaturas de planos de comercialização e venda. Trata-se de um novo instrumento que nos interessa valorizar, sobretudo, nas zonas com menor maturidade turística e onde é importante crescer em número de dormidas. Também queremos apoiar as redes de oferta colaborativa que juntam empresas de várias áreas do turismo e que podem ser importantes na afirmação de alguns destinos sub-regionais.
Quais os principais desafios do trabalho realizado pelo Turismo do Alentejo no sentido de promover uma zona do interior do país que tradicionalmente apresenta grandes assimetrias face às localidades do litoral?
No Alentejo o processo de crescimento tem sido diferente. Note que o Interior tem liderado os números da oferta e da procura nos últimos anos, muito pelo efeito de Évora e da região envolvente, mas outras sub-regiões e destinos locais têm emergido com múltiplas ofertas e novos produtos. Veja-se a coleção de Praias Fluviais no Alqueva, a que se juntam outras de interior já existentes, como a do Alamal e a da Tapada Grande, a recém-inaugurada “Rota das Fortalezas Abaluartadas”, com Elvas e Marvão a darem cartas ou as novas infraestruturas de visitação em Castelo de Vide e Aljustrel, só para dar alguns exemplos mais recentes. A estes exemplos, acresce todo o trabalho que temos desenvolvido na infra-estruração dos Caminhos de Santiago, da rede de cycling e de caminhadas e do programa Live Campers para as áreas de serviço de autocaravanas. Os produtos associados ao património cultural e construído, a marca forte de ruralidade do território, a gastronomia e vinhos alentejanos e, mais recentemente, as motivações associadas ao turismo de natureza, têm sido os nossos grandes argumentos de venda do interior alentejano. Mas muito trabalho há ainda por fazer, por isso as medidas anunciadas pelo Governo, há três meses atrás, para dar um novo impulso ao turismo em áreas de interior, não poderiam ser para nós mais oportunas. Quanto ao Litoral, tem um potencial fantástico e pode no médio prazo, diria cinco anos, vir a revelar-se como um dos grandes destinos europeus. Em 2022 já foi a sub-região com mais dormidas no Alentejo e isso tem de ser valorizado. Portanto, tudo argumentos para que cada vez mais turistas, portugueses e internacionais, visitem o Alentejo.
Quais as principais caraterísticas e valências da oferta turística proporcionada no Alentejo. Para além disso, de que forma é que esta mesma oferta é diferencia face à oferecida no resto do país? Creio que o Alentejo se diferencia, naturalmente, dos restantes destinos. A região tem uma identidade e uma autenticidade muito próprias. A linha do horizonte, a perder-se ao fundo, o sentimento de evasão que os grandes espaços conferem, a preservação ambiental, o montado, o aspeto pitoresco das aldeias e das vilas. Há uma certa ideia de regresso às origens, ao passado. Esta motivação é muito sentida, por exemplo, nas viagens para o turismo rural, que constitui um dos principais produtos da Região e que tem crescido muito nos últimos anos. A riqueza patrimonial é um outro aspeto da oferta turística em evidência, com vários lugares e manifestações classificados pela UNESCO. A procura por estes locais é significativa. O Alentejo está também associado à hospitalidade, à personalização do acolhimento, ao contacto com as pessoas. Procuramos enquadrar todas estas dimensões no nosso marketing, bem como as preocupações com a sustentabilidade.
Qual o impacto/importância que o turismo representa para a região, nomeadamente a nível económico e de desenvolvimento territorial e de infraestruturas?
O impacto económico do turismo tem crescido. Em termos globais, o Alentejo foi a região do Continente que, em 2022, mais cresceu em receitas, comparativamente, ao ano de 2019, quase 28% e bem acima da média nacional, 16.5%. Por segmentos de alojamento, há a evidenciar a progressão impressionante da Turismo Rural, que avançou nos proveitos globais 56.3%, face a 2019. O Alentejo foi, igualmente, a região do Continente que mais cresceu no RevPar – 22.6%- o que comprova a crescente qualificação do destino com a conquista de novos segmentos de mercado. A julgar pelos números do primeiro semestre de 2023, esta trajetória consolidar-se-á este ano .Estes dados são muito reveladores da capacidade de afirmação turística do Alente-jo. Só este ano há uma previsão de abertura de cerca de 15 novas unidades de alojamento, entre hotéis e outras tipologias. Este nú-mero pode estar um pouco sobreavaliado e é possível que não se chegue até lá, mas evi-dencia muito a dinâmica de investimento a que estamos a assistir. Por outro lado, as taxas de ocupação têm vindo a subir e isso chama a atenção dos investidores. Acredi-to, também, que a imagem do Alentejo, associada ao seu capital natural e cultural de excelência – que lhe tem valido um posicio-namento de relevo nos mercados turísticos – faz muitas das vezes a diferença na hora da decisão de escolha da região para inves-tir, por parte do investidor. O Litoral, Évora e a zona de Beja/Vidigueira parecem ser as áreas mais dinâmicas em termos de aber-tura de novos estabelecimentos hoteleiros este ano, mas há também boas perspetivas noutros territórios no curto e médio prazo. Queremos lançar novos programas, para atrair investimento para outras zonas da nossa área regional de turismo, que apre-sentam menos dinamismo, ainda que por razões distintas. Falo, por exemplo, do Alqueva acerca do qual pretendemos lançar a discussão sobre a revisão do Plano de Ordenamento da Albufeira do Alqueva e Pedrógão. Creio que este plano é muito restritivo para a atividade turística, mas teremos de discutir este assunto em primeiro lugar com os autarcas. Toda esta dinâmica deve ser correspondida com investimentos pelo Governo, na melhoria das acessibilidades à região, nomeadamente, ao Baixo Alentejo e no afluxo de mais fundos europeus ao desenvolvimento e promoção dos ativos públicos do turismo e serviços turísticos.
O Alentejo é uma zona muito rica em património cultural, tradições sociais e paisagens muito singulares (sendo que alguns são até reconhecidos pela UNES-CO). Na sua ótica, quais os principais pontos turísticos da região e as suas valências que recomenda a vista aos nossos leitores?
O Alentejo é um imenso caleidoscópio cheio de cores, mutações, paisagens e cheiros. Tem uma costa fantástica com excelentes e surpreendentes praias, onde podemos destacar mais a sul, Vila Nova de Mil Fontes, Porto Covo ou São Torpes. A norte de Sines desponta um mundo novo com vários micro destinos envoltos em glamour e sofisticação, como Melides ou Comporta/Carvalhal, que atraem hoje a atenção da media internacional. E, claro, Troia, com o seu excelente resort para famílias. Não podemos esquecer ainda Alcácer do Sal, com a sua marginal lindíssima à noite. Novos produtos vão despontando nesta parte do território, como o golfe e a oferta hoteleira que se vai qualificando a bom ritmo. No interior vai ganhando força um Alentejo mais azul, com uma linha de praias fluviais de grande qualidade, que começa no Alamal, no concelho de Gavião, um sítio surpreendente pela sua beleza paisagística, até à praia da Tapada Grande, em Mértola. Na área de influência do Alqueva são já oito as praias que os visitantes podem percorrer, designadamente, Azenhas d’El Rei (Alandroal) praias de Alqueva e Amieira (ambas no concelho de Portel), Monsaraz (Reguengos de Monsaraz), Mourão, Cinco Reis (em Beja) e uma praia em Moura a qual será, brevemente, inaugurada. De destacar também a Praia Fluvial de Albergaria dos Fuzos (Cuba), integrada no Eco Parque do Alentejo Central, um local inesperado, entre Évora e Beja. São sítios magníficos a descobrir neste final de verão e início de outono. A norte temos o Parque Natural da Serra de São Mamede, com o triângulo Castelo de Vide, Marvão e Portalegre em evidência, um dos principais spots do país para cycling, e Nisa, com os seus bordados e património histórico e cultural. Mais a sul, toda a zona da Serra de Ossa merece uma visita. No Alentejo são várias as manifestações culturais inscritas nas Listas do Património Cultural Imaterial da UNESCO, designadamente, o Cante Alentejano, o Figurado em Barro de Estremoz, as Festas do Povo de Campo Maior e o Fabrico de Chocalhos (Alcáçovas), estando esta última manifestação inscrita na Lista de Salvaguarda Urgente. No âmbito do património construído, o Centro Histórico de Évora e a Cidade-Quartel Fronteiriça de Elvas e as suas Fortificações, integram a Lista do Património Mundial da UNESCO. Ainda no âmbito do reconhecimento da UNESCO, a Reserva da Biosfera de Castro Verde foi a primeira, a sul do Tejo, a merecer tal classificação.
Para além de toda a riqueza material e imaterial, o Alentejo é ainda uma zona muito reconhecida pela sua gastronomia típica e pelos bons vinhos. Fale-nos um pouco sobre esta vertente tão importante que a região tem para oferecer.
Sem dúvida que a gastronomia, aliada aos vinhos, constituem âncoras de excelência de atração de visitantes à região do Alentejo. Temos hoje uma rede de restauração de elevada qualidade na qual pontuam excelentes chefs, muitos deles formados na Escola de Hotelaria e Turismo de Portalegre, que tem desempenhado um papel relevante na qualificação dos nossos profissionais. A par dos novos restaurantes estão alguns estabelecimentos de restauração que se reinventaram com novas ementas e formatos e outros que mantêm a genuinidade e autenticidade do receituário tradicional. No Litoral começam a emergir conceitos mais sofisticados, satisfazendo necessidades de outro tipo de clientelas, o que é muito interessante. Acredito que este binómio, gastronomia e vinhos, pode trazer-nos ainda maior notoriedade e receitas. Para isso temos de organizar uma boa rede de eventos e qualificar outros com bons conteúdos. Estamos já a trabalhar nesta linha de ação. No que se refere ao Enoturismo é fundamental organizar um calendário ao longo de todo o ano, que ponha em evidência a diversidade e a riqueza das atividades que aí se desenvolvem.
Quais as metas a curto/médio prazo que o Turismo do Alentejo pretende aplicar?
Definimos alguns indicadores e metas que orientarão, estrategicamente, a nossa intervenção e servirão a avaliação do desempenho global do destino Alentejo; queremos reforçar o peso das dormidas da NUT II Alentejo no total nacional, passando de 4.3% em 2022, para os 5.3% em 2027; queremos diminuir a diferença na proporção de hóspedes estrangeiros que visitam a região face à média nacional, de 34% em 2019, antes da pandemia, para 40% em 2027; queremos aumentar o peso dos proveitos totais no total nacional, posicionando o Alentejo como destino de valor acrescentado. As receitas globais do nosso turismo representaram 4,4 % do total do país em 2022, pretendemos que esse peso ultrapasse os 6% em 2027.