: 25 de Abril, 2025 Redação:: Comentários: 0

Aos 16 anos Zita Rocha conheceu Mário Rocha, o grande amor da sua vida – e também o seu parceiro de negócios. Juntos fundaram a Antarte, uma marca de mobiliário e decoração que rapidamente se tornou um sucesso em Portugal e além-fronteiras. Hoje, Zita é uma mulher realizada, que aprendeu a gerir melhor o tempo para se dedicar, a 100%, à família e à profissão.

Para começarmos esta conversa, gostava de saber um pouco mais sobre o seu percurso. Nascida na Venezuela, com que idade veio para Portugal e o que motivou essa mudança?

Nascida na Venezuela em janeiro de 1976, filha de pais portugueses, vivi toda a minha infância neste país e fui muito feliz, apesar de estar longe do resto da família. Considero que fui uma sortuda. A América Latina tem uma tranquilidade, uma alegria de viver que se entranha na pele.Lembro-me das cores vivas das ruas, dos cheiros da comida, do som constante da música e da maneira calorosa com que as pessoas se tratam. Crescer ali foi um presente. Ainda que houvesse desafios, o amor dos meus pais e a cultura vibrante que me rodeava tornaram aqueles anos mágicos.Vim para Portugal com 13 anos, devido à instabilidade política que se começava a sentir na Venezuela. Foi uma mudança muito drástica. Cheguei no final de setembro e já fazia algum frio. Lembro-me bem de sair da escola às 18h30 e já ser noite — algo que me pareceu estranho e até um pouco assustador. O português era a língua que falávamos em casa, mas a minha pronúncia era diferente, marcada por aquele “portunhol” típico de quem nasceu fora. Isso fez de mim alvo de muitas brincadeiras por parte dos colegas — o que hoje se chama bullying. Tive de me esforçar imenso para perder o sotaque e adaptar-me. Para me integrar mais facilmente e alcançar os meus objetivos, envolvi-me em várias atividades extracurriculares. Joguei basquetebol, colaborei na catequese… fiz tudo o que pude para encontrar o meu lugar.

Quando tinha 16 anos, conheci o Mário Rocha — o amor e companheiro da minha vida. Ele foi o meu porto seguro numa fase em que ainda me estava a adaptar, a construir a minha identidade entre dois mundos. Crescemos juntos, lado a lado, aprendendo um com o outro. Partilhámos sonhos, medos, conquistas e dificuldades. O Mário sempre me apoiou nas minhas decisões, incentivou-me a seguir os meus objetivos e ajudou-me a manter viva aquela alegria e leveza que trouxe da infância na América Latina.

Antes de entrar no mundo do mobiliário, foi proprietária de uma perfumaria. De que forma é que essa experiência contribuiu para o seu trajeto profissional?

A minha primeira experiência profissional foi numa perfumaria. Foi aí que comecei a aprender a lidar com o público, a perceber diferentes tipos de pessoas, gostos e maneiras de comunicar. Ajudou-me a desenvolver empatia, paciência e aquele sorriso sempre pronto, que tantas vezes faz a diferença. Mas, com o tempo, comecei a sentir que era um trabalho demasiado parado para mim. Sentia falta de movimento, de desafio. Eu e o Mário começámos a conversar sobre o futuro, sobre o que podíamos fazer para crescer e conquistar algo mais nosso. Começámos então a explorar novas possibilidades, à procura de algo que nos desafiasse e nos permitisse evoluir tanto profissional como pessoalmente.

Como é que o seu caminho se cruzou com o do seu marido, Mário Rocha, e o que vos levou a fundar a Antarte em 1998?

Em 1998, tomámos uma das decisões mais importantes das nossas vidas a nível profissional: decidimos abrir a Antarte. Foi um grande desafio. Começámos do zero — sem garantias, sem certezas, mas com uma vontade imensa de construir algo nosso. Tínhamos garra, espírito de sacrifício e uma confiança mútua que nos dava força para enfrentar cada obstáculo. Não foi fácil. Houve dias difíceis, noites sem dormir, momentos de dúvida. Mas também houve conquistas, pequenos passos que nos mostravam que estávamos no caminho certo. Acreditámos sempre no nosso projeto e, mais importante ainda, acreditámos um no outro. Hoje, ao olhar para tudo o que construímos, sinto um orgulho imenso. A Antarte não é apenas uma marca — é parte da nossa história, do nosso crescimento como pessoas e como casal. Chegar até aqui foi uma jornada de muito trabalho, mas também de muita dedicação.

Como tem sido o percurso da Antarte desde a sua fundação até aos dias de hoje? Quais foram os momentos mais marcantes ao longo do caminho?

Ser mulher num mundo de trabalho maioritariamente masculino nunca foi fácil. Ainda mais sendo tão jovem e tendo de liderar pessoas mais velhas do que eu. Foi extremamente desafiante conquistar respeito e espaço. Tive de provar o meu valor vezes sem conta, de mostrar que a minha idade e o meu género não definiam a minha capacidade de liderar, de decidir, de inovar. O caminho foi duro. Tive de aprender tudo — e quando digo tudo, é mesmo tudo — sobre produção de mobiliário. Desde os materiais às técnicas, da logística ao design. Quis estar envolvida em cada detalhe, porque sabia que só assim poderia falar de igual para igual com quem trabalhava comigo. E, como se não bastasse, a vida pessoal também exigia o seu espaço. Tive três filhos — três bênçãos que me enchem o coração, mas que também pediam tempo, atenção, amor. E tinha o Mário, meu parceiro de vida e de trabalho. Mas confesso: nem sempre foi fácil separar as águas. Aliás, quase nunca foi. O trabalho vinha para casa, e a casa infiltrava-se no trabalho. Viver e empreender lado a lado é uma prova constante de equilíbrio.

A marca já esteve envolvida em diversos projetos de prestígio internacional, como a criação do cadeirão para o Papa Francisco. Há algum projeto que tenha tido um significado especial para si?

A Antarte nasceu dessa inquietação — e cresceu com a nossa dedicação. Todos os projetos em que a Antarte esteve envolvida foram sempre muito interessantes e importantes para o crescimento da marca. Procurámos estar ligados a iniciativas com valor, com identidade, que refletissem os nossos princípios e ajudassem a posicionar a Antarte não apenas como uma empresa de mobiliário, mas como uma marca com alma, com propósito. Pessoalmente, identifico-me especialmente com os projetos de solidariedade social — ajudar o próximo sempre foi algo que me tocou profundamente, sobretudo quando envolve crianças. Acredito que temos o dever de retribuir, de usar o que conquistámos para fazer a diferença na vida dos outros. Esses momentos, mais do que qualquer prémio ou conquista, são os que verdadeiramente me preenchem.

Voltando a si, quem é Zita Rocha fora do contexto profissional? Quais são as características que melhor a definem e o que mais gosta de fazer nos tempos livres?

Fora do contexto profissional, sou uma apaixonada por desporto. Pratico entre quatro a cinco vezes por semana — pilates, ginásio e surf, que me traz uma sensação de liberdade incrível. Gosto de me manter ativa, tanto pelo corpo como pela mente. Sou também avó de três maravilhosos meninos: o Martim, de 7 anos, o Bernardo (ou Becas, como carinhosamente o chamamos), de 3, e o Dinis, de 2 anos. E em maio chega o pequeno Mateus, que já é muito esperado por todos nós. Sinto-me verdadeiramente afortunada. Tento ajudar as minhas filhas em tudo o que posso, principalmente na logística do dia a dia — ir buscar os netos ao colégio, dar apoio nas tarefas mais práticas… tudo para que elas possam focar-se no trabalho e dar o seu melhor na Antarte. No fundo, faço o que qualquer avó babada faz: ajudo com amor, mimo e… muitas brincadeiras! Adoro estar com os meus netos, fazer traquinices e viver o momento com eles. O Martim, quando era mais pequenino, dizia-me: “Vozita, tu és muito radical! Fazes surf, trepas árvores e ainda fazes aeropilates!” Confesso que me ri imenso — e, no fundo, acho que é isso que quero continuar a ser: uma avó radical, presente e divertida.

Também adoro conviver com amigas — aquelas conversas boas que nos fazem rir e esquecer o tempo. Ir ao teatro, ver concertos, jantar com casais amigos… tudo isso faz parte daquilo que me alimenta a alma. Gosto de boa disposição, de celebrar a vida, de estar rodeada de pessoas com energia positiva. E, se há algo que me apaixona profundamente, é viajar, viajar, viajar. Explorar novos lugares, novas culturas, novas paisagens — é algo que me inspira, que me faz sentir viva e em constante descoberta. Cada viagem é uma história, uma memória, uma aprendizagem.

Sendo uma mulher empreendedora, com uma rotina tão exigente, como consegue conciliar a vida pessoal, familiar e profissional?

Felizmente, trabalhei muito para o crescimento da Antarte. Abdiquei de muitas coisas — tempo, descanso, até momentos em família — para fazer este sonho crescer e se tornar realidade. Foi uma entrega total, com sacrifícios, mas também com muitas recompensas. Quando os meus filhos eram pequenos, foi muito difícil conciliar tudo. A verdade é que tive de ser muito forte e resiliente para conseguir dar conta do recado — ser mãe, empresária, esposa… tudo ao mesmo tempo. Foram anos intensos, de muito sacrifício e pouco descanso.

Esse percurso permitiu-me, aos 43 anos, parar e repensar. A vida estava demasiado acelerada, a saúde beliscada: viagens constantes entre lojas, fábrica, decisões a mil por hora. Decidi então abrandar. Hoje, estou apenas com as três lojas do Porto — uma escolha consciente, que me permite continuar presente no negócio, mas também ganhar espaço para mim. Agora posso dedicar mais tempo às coisas que me fazem feliz: o desporto, os momentos em família, os mimos aos netos, a tranquilidade de estar mais próxima do Mário, das minhas filhas e daquilo que realmente importa. Foi preciso coragem para construir tudo o que construí, mas também foi preciso coragem para abrandar e escolher viver com mais qualidade. Saber abrandar também é sabedoria. Aprendi que a vida tem de ser bem vivida, com tempo, com presença, com espaço para sentir e crescer. Não somos apenas aquilo que conquistamos no trabalho — somos muito mais do que isso. Devemos crescer individualmente, como seres humanos. Aprender a cuidar de nós, dos outros e do que realmente importa. Hoje, faço questão de viver com mais consciência, com mais amor e, acima de tudo, com mais gratidão por tudo o que a vida me deu — e continua a dar. Hoje, sou uma pessoa mais calma, mais madura e experiente. Com o tempo, aprendi a gerir melhor a minha energia e a definir prioridades. Consigo coordenar tudo com mais facilidade — o trabalho, a família, os momentos só meus. Claro que nem sempre é perfeito… há dias em que os meus netos me aborrecem e eu digo-lhes a rir:“ Eu sou nova demais para isto!” Mas a verdade é que adoro este equilíbrio que consegui alcançar. Continuo a trabalhar, continuo a estar presente para os meus — e continuo a viver com paixão por tudo o que faço.

Que conselho daria a uma jovem mulher que está neste momento a dar os primeiros passos no mundo do trabalho?

Quem quiser vingar no mercado de trabalho, deixo o meu conselho: é preciso empenhar-se. Trabalhar com seriedade, buscar conhecimento e preparar-se para o futuro. O sucesso não cai do céu — constrói-se com esforço, paixão e propósito.

O que espera do futuro, tanto a nível pessoal como profissional? E no que diz respeito à Antarte, há novidades que possa revelar?

O futuro parece-me bastante acelerado — com tanta coisa nova a surgir, tanta mudança, tanta evolução. Acompanhar as tendências, a tecnologia, as novas formas de pensar e viver… é um desafio constante, mas também muito estimulante. A nível profissional, sinto que a Antarte está preparada para esse futuro. Temos sangue novo na empresa — os meus filhos, a Mária, a Sara e o Vítor, já fazem parte ativa da equipa e estão preparados para enfrentar tudo o que aí vem. Têm ideias frescas, visão, coragem e, acima de tudo, os mesmos valores que sempre guiaram a nossa marca. A nível pessoal, espero continuar a viver com equilíbrio, com saúde e com alegria. Quero estar presente para a minha família, continuar a aproveitar a vida, viajar, rir, fazer desporto, brincar com os netos… e manter-me curiosa, com vontade de aprender e crescer. O futuro é uma oportunidade — e eu estou pronta para o viver com o coração aberto.