Estivemos à conversa com Rui Pereira, CEO da Private Broker e da Twist Capital, que nos deu a conhecer as suas duas empresas e abordou não só os principais desafios que o mercado imobiliário tem enfrentado nos últimos anos, como as perspetivas no que diz respeito ao futuro do mesmo.
Primeiramente gostávamos de co-nhecer um pouco mais sobre si. Quem é Rui Pereira e como tem sido traçado o seu percurso profissional?
A minha vida profissional começou muito cedo. Tinha 16 anos de idade e ainda estudava quando comecei a trabalhar numa empresa farmacêutica multinacional, o que me deu uma visão mais ampla do mundo do trabalho e daquilo que seria possível atingir, em termos profissionais e pessoais. Aos 19 anos, por ambição pessoal, dei os primeiros passos no sentido da criação de um negócio próprio, que se veio a materializar poucos anos mais tarde. Após um longo percurso, repleto de aprendizagens, e passando por várias universidades, nacionais e internacionais, acabei por encontrar no setor imobiliário a minha área de atuação preferencial.
Ingressou no ramo imobiliário em meados de 2010. O que o apaixona nesta área?
Na altura estávamos em plena crise financeira e imobiliária, o que me levou a pensar que este mercado estaria sub-valorizado e que existiam várias oportunidades de negócio que poderiam ser capitalizadas. O que me apaixonou nesta área foi a possibilidade de tornar algo que aparentemente mais ninguém encontrava valor, mas inevitavelmente investidores foram aparecendo com a mesma visão que eu. Naquele momento foi um desafio constante, no entanto, a satisfação de perceber que tinha concedido oportunidades de investimento que mais tarde trariam retornos elevadíssimos, foi sempre a minha paixão.
Em que momento da sua vida é que surge a Private Broker? Enumere os serviços que disponibilizam ao cliente.
A Private Broker surge em 2015, numa altura em que começou a existir uma afluência anormal para a época, num segmento mais elevado que estava praticamente morto. Em Lisboa e não só começámos a identificar compradores e investidores vindos do estrangeiro e percebemos o fraco acompanhamento que era dado a estas pessoas profundamente desconhecedoras tanto da nossa realidade, como também dos procedimentos a tomar na compra de um imóvel, desde os benefícios fiscais, passando por projetos de investimento até ao acompanhamento pós-venda – que, na maioria das vezes, eram largados pelos consultores que os acompanhavam, não falando sequer a nossa língua, tendo portanto uma dificuldade extrema nas pequenas coisas do dia a dia. Coisas como que pessoas contratar, seguros, contratos com empresas de fornecimento de serviços diversos, por exemplo. Aspetos práticos de contabilidade e gestão no nosso país, tudo aquilo que possa de facto parecer bastante simples para quem é português, mas que para um estrangeiro se afigura mais difícil, até porque nós não temos leis e regulamentação assim tão simples e prática no nosso país, pelo contrário. Aconselhamento relativamente a possíveis novos investimentos, rentabilidade e custos, entre outros.
Posteriormente fundou a Twist Capital. Qual é a principal missão desta empresa?
A Twist Capital nasceu na sequência de uma evolução necessária no âmbito do desempenho das nossas empresas, tornando-se numa empresa de investimento privado que abrange vários setores económicos dos quais o mercado imobiliário, financeiro, automóvel, entre outros, fazem parte. Mais tarde deu oportunidade a um grupo muito restrito de investidores de participar nestes mesmos investimentos, usufruindo das rentabilidades proporcionadas, com baixo risco associado. Na realidade, o que se pretende é o maior retorno e com baixo risco associado.
Na sua opinião, que fatores fazem de Lisboa uma cidade capaz de atrair o capital estrangeiro?
Do meu ponto de vista, Lisboa continua a ser uma das capitais mais seguras da Europa e do mundo, culturalmente rica, com a sua identidade própria e um povo naturalmente hospitaleiro. Além disso, é uma cidade relativamente barata se considerarmos o custo médio de vida noutros países. Temos uma série de caraterísticas não só geográficas (a proximidade de praia, serra, espaços verdes, etc.), mas também ao nível da gastronomia, cultura, qualidade de vida que dificilmente se encontram em muitas outras metrópoles.
Por outro lado, quais considera se-rem os maiores entraves a este tipo de investimentos?
Então, vivemos num país repleto de burocracias, excessivamente regulamentado por um lado, e deficientemente regulado por outro, em que o serviço público simplesmente não funciona, tornando determinados processos num verdadeiro pesadelo burocrático, onde a falta de transparência e de resposta são protagonistas. A confiança dos investidores depende muito da estabilidade política e legislativa de cada país, o que infelizmente este e outros governos não têm conseguido garantir, levando à desconfiança dos investidores. Surgem constantemente alterações, o que faz de Portugal um país instável para o investidor estrangeiro.
Que comentário lhe merece as notícias que dão conta do fim do programa dos Vistos Gold e do Regime Fiscal do Residente Não Habitual (RHN)?
Na minha opinião será uma medida catastrófica para Portugal, na medida em que o governo atribui a crise no setor da habitação e respetivo aumento de preços aos residentes não habituais. Ao revogar o estatuto de RNH, o governo está excessivamente fixado na procura e não na oferta, sendo que o cerne da questão está mesmo na falta de oferta habitacional. Um aparte: depois de 2011 e da tão falada Troika, o mercado encontrava-se inundado de imóveis, com valores que eram bastante apetecíveis, a banca “abriu portas” à concessão de crédito, a preços bastante acessíveis. Ora, num mercado com bastante oferta e financiamento mais acessível, não só o comprador particular começa a comprar, como sobretudo os pequenos investidores, estes segundos a remodelar. Eram opção à falta de nova construção e a preços bastante mais acessíveis. E o mercado continuou a pagar e os preços a subir. Entre 2011 e 2021, por exemplo, só tivemos um aumento de 3% de nova construção. Esta discussão até pode ficar para outra altura, mas o que pretendo dizer com isto é que não foi o RNH que verdadeiramente motivou a escalada a que temos assistido.nForam aproximadamente 75 mil os beneficiários deste regime, em 14 anos (desde 2009, quando foi criado), o que na realidade não terá tido um impacto significativo no que diz respeito à crise que vivemos atualmente. Receitas fiscais, impostos indiretos, fixação de novas empresas, que criavam trabalho, aumento do consumo e investimento, é tudo isto e ainda mais, que vamos perder ou deixar de ganhar, que alimentava a economia e gerava mais rendimento. Vamos perder rendimento e conhecimento valioso por parte de cidadãos estrangeiros, na nossa economia. A alavancagem que estes residentes nos trouxeram, em termos económicos e profissionais, o empreendedorismo… Tudo isto se perde. Não somos um país orientado para o empreendedorismo ou cujas políticas o favoreçam. O efeito reputacional desta revogação é brutal, a nível internacional e da confiança. Novos projetos de investimento e de criação de postos de trabalho acabam por não se concretizar e são os países vizinhos ou concorrentes principais que beneficiam desta nova política no nosso país, nomeadamente Espanha, Itália e Grécia. O governo não fornece estudos ou dados que verdadeiramente demonstrem a razão de ser desta revogação. Não temos um estudo de impacto para esta medida, por exemplo – o que a torna, a meu ver, meramente política, senão populista, quase pré-eleitoral. Além disso, o regime de RNH não se aplica aos demais impostos como o IVA, IMT, IS, IMI, AIMI, IUC, Segurança Social, entre outras taxas. Quando o nosso governo diz que os RNH custaram ao nosso país 1.360 M, em 2022, esquecem-se de quantificar (também não o sabem dizer) quanto nos trouxeram ao nível da receita fiscal dos impostos acima mencionados e respetivo contributo para a nossa economia.
Acredita que o setor imobiliário está suficientemente preparado para dar resposta à procura de que tem sido alvo, nomeadamente por parte dos cidadãos americanos?
Para ser honesto, não. O mercado norte americano, tem caraterísticas muito distintas de outros países, nomeadamente no que toca ao investimento, os norte americanos mais abastados são investidores natos, quer seja na habitação, como noutro tipo de áreas. Ao contrário do Brasil, por exemplo, os cidadãos americanos não procuram emprego em Portugal, procuram uma residência secundária onde possam desfrutar das maravilhas do nosso país, não deixando de parte alguma rentabilidade da qual possam usufruir. A vinda de cidadãos americanos para Portugal, na minha opinião, estará só no início e deparamo-nos, mais uma vez, com o problema da oferta. Se equacionarmos que devido à burocracia que existe no licenciamento e construção de edifícios novos por todo país, podemos estar à beira de uma crise ainda maior de oferta, o que vai gerar ainda mais aumentos nos valores da habitação
Como é que olha para o futuro do mercado imobiliário?
O mercado imobiliário no seu todo não está exclusivamente relacionado com compradores estrangeiros, pelo contrário, a procura interna continua muito forte. Esta necessidade da oferta ignorada pelos governos tem levado a uma escalada nos preços sem precedentes, o acesso à habitação deve, ou neste caso deveria ser um direito, não um luxo para a nossa população que até agora se apoiou muito no sistema bancário para a sua aquisição. Se as regras não forem alteradas, como as burocracias municipais no que concerne a projetos e licenciamentos, custo do IVA na construção, apoio com juros bonificados na aquisição jovem, temo que a situação se agrave nos próximos tempos. O programa Mais Habitação, não tem nenhuma medida que vá de encontro à necessidade de compradores e empresários da construção que viabilize a habitação a custos reduzidos, está muito focado no investimento por parte do governo em edifícios que ficarão muito aquém do necessário sem investimento privado.
E no que concerne às suas duas empresas (Private Broker e Twist Capital), que objetivos ainda espera concretizar?
A Private Broker continuará a sua atividade no acompanhamento e serviço de excelência junto dos seus clientes, dando a conhecer também Portugal ao mundo, como temos feito no Brasil, Canadá, Estados Unidos, Reino Unido e, mais recentemente, nalguns países que identificámos com enorme potencial para atrair investimento. Relativamente à Twist Capital, temos reduzido o investimento imobiliário em Portugal pela falta de oferta e burocracias impostas nos municípios, estando mais orientados neste momento para investimentos no mercado financeiro que tem tido uma rentabilidade muito superior ao imobiliário, e com o apoio em algumas start-ups na área da inteligência artificial. O nosso objetivo até ao final de 2023 é obter uma rentabilidade muito perto dos 60%.