O final de cada ano traz, por si só, um convite à reflexão do ano que termina e à análise dos objetivos que foram atingidos e daqueles que terão de ser transpostos para os 365 dias seguintes. Na ASPE orgulhamo-nos de ter lutado mais um ano, afincadamente, pelos valores que nos pautam, e pela busca por uma melhor qualidade de vida para os Enfermeiros em Portugal.
Para além de diversas reuniões decorridas ao longo do ano com os diferentes Grupos Parlamentares e de outras tantas de alerta junto do Ministério da Saúde, o trabalho desenvolvido pela ASPE foi muito além das mediações junto da tutela e das ações de sensibilização junto dos partidos políticos.
A publicação da Lei n.º 51/2025, que entra em vigor com a Lei do Orçamento de Estado de 2026 (LOE 2026), foi a maior das vitórias que conseguimos. Esta Lei, que elimina as posições remuneratórias intermédias dos enfermeiros, estabelece uma alteração no Decreto-Lei n.º 71/2019 de 27 de maio, e ao Decreto-Lei n.º 111/2024 de 19 de dezembro, vindo corrigir uma grande injustiça causadora de graves inversões de posição remuneratória entre Enfermeiros. A eliminação das posições virtuais – aprovada no Parlamento a 14 de março – era uma reivindicação da ASPE já desde 2019, e o reconhecimento deste direito representa em grande medida a força da ASPE: o único sindicato que nunca desistiu de defender estes enfermeiros e que sempre acreditou que os responsáveis políticos acabariam por resolver esta injustiça.
Outro dos temas em grande destaque este ano foi o Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) que, após ter sido injustificadamente “diabolizado” por alguns sindicatos, continua a ser a única ferramenta que protegerá os enfermeiros em situações de “zonas cinzentas” e onde a falta de legislação impera. A ASPE definiu as suas “linha vermelhas” no dia 3 de setembro de 2025 – data da primeira reunião negocial – mesmo sem conhecer as propostas do Governo e mantém-se firme na recusa de um regime de adaptabilidade e de bolsa de horas que dê poderes à entidade empregadora para decidir unilateralmente alterar o horário do trabalhador com 24 horas de antecedência, ou períodos de aferição longos que eliminem o pagamento de horas suplementares, como foi recentemente assinado pela Plataforma dos 5 Sindicatos com a Associação Portuguesa de Hospitalização Privada (APHP).
Após a segunda ronda negocial com o Ministério da Saúde, decorrida a 24 de setembro, cerca de 80% das medidas descritas até ao quinto capítulo da proposta inicial do Governo entregue à ASPE foram aceites pela associação sindical. Tal feito deve-se ao facto de as normas mencionadas irem ao encontro daquelas que a ASPE sempre defendeu e apresentou ao Governo em primeira instância, e cujo desenvolvimento dá alento à ASPE para possibilidade de continuação das negociações no próximo ano.
Tal como referido no início, também as reuniões com os Grupos Parlamentares figuraram grandemente ao longo deste ano na agenda da ASPE. Desde a necessidade de alterações legislativas com impacto na remuneração dos Enfermeiros, às irregularidades com as horas suplementares realizadas pelos enfermeiros do INEM, passando pela abertura de procedimentos concursais para enfermeiros especialistas, vários são os temas colocados “em cima da mesa” pela ASPE. Este último ponto foi mais um dos pontos-chave nas reuniões: a ASPE defendeu a contratação imediata pelo INEM dos Enfermeiros que se encontram em bolsa de recrutamento e a abertura de procedimento concursal para a categoria de enfermeiro especialista, que veio a ocorrer em novembro.
No âmbito da formação e valorização profissional, a ASPE expandiu este ano o seu serviço de apoio e formação, por meio do programa ASPEform@, no qual disponibiliza webinares, com conteúdos dedicados aos direitos laborais e à formação contínua para enfermeiros, associados ou não da ASPE.
No cômputo jurídico a ASPE mantém-se igualmente ativa na denúncia de ilegalidades e injustiças laborais ocorridas contra Enfermeiros em todo o país. Este ano a ASPE reforçou o seu Gabinete Jurídico e já têm em curso várias ações judiciais motivadas por incumprimento geral dos direitos laborais dos enfermeiros, por incorreto posicionamento remuneratório e não pagamento dos retroativos da progressão na carreira desde 2018. Temos ainda algumas situações de assédio laboral, tendo, recentemente, ganho uma providência cautelar contra a Unidade Local de Saúde de Santo António, E.P.E. (ULSSA), que determinou o regresso da enfermeira ao seu posto de trabalho, após considerar o ato de gestão que lhe deu origem como uma decisão arbitrária, discriminatória e lesiva da atividade sindical.
Em situações de irregularidades laborais, a ASPE denunciou publicamente práticas que considerou injustas, por exemplo, a coação para realização repetida de horas extra no Hospital Prof. Dr. Fernando Fonseca (ULS Amadora/Sintra). O que tem sido especialmente gravoso pela recusa dos sucessivos concelhos de administração de aderir aos Acordos Coletivos de Trabalho em vigor e de renegociar os acordos de empresa há muito ultrapassados.
A ASPE assinalou também, ao longo destes meses, junto das respetivas entidades empregadoras, Direção Executiva do SNS e do Ministério da Saúde, várias irregularidades nos procedimentos concursais, sobretudo para as categorias de Enfermeiro Especialista e de Enfermeiro Gestor. Conscientes que se perpetuam práticas e entendimentos que não respeitam as normas legalmente estabelecidas, a ASPE passou a monitorizar de modo sistemático todos os avisos de abertura e a exigir junto dos responsáveis institucionais a emissão de declarações de retificação que asseguram os princípios fundamentais de qualquer procedimento concursal: liberdade de candidatura, igualdade de condições e oportunidades para todos os enfermeiros, bem como a neutralidade da composição do júri.
As carreiras de enfermagem são a única carreira da administração pública que permitem ingresso por qualquer categoria, o que é fundamental para atrair enfermeiros que tiveram que emigrar ou que que pretendam mudar de instituição ou região, vindos do setor público, privado ou social. Por isso a ação da ASPE tem sido consequente, resultando na maioria das situações em atualização dos avisos de abertura, na sequência de declarações de retificação, repondo o direito de liberdade de candidatura e normas de determinação do posicionamento remuneratório no momento da contratação.
Já com os olhos postos no futuro, a ASPE compromete-se a continuar o caminho á percorrido dando prioridade a uma combinação de ação sindical direta, através de negociações, intervenções institucionais e denúncias públicas, bem como de apoio aos seus associados, através de sessões de formação, de esclarecimento jurídico, e de acompanhamento individualizado.
ASPE procurará ainda manter visibilidade mediática, assumindo o papel de vigilante e denunciadora, sinalizando más práticas quando surgem, o que contribui para a pressão pública e accountability, algo de extrema importância num sistema de saúde sob pressão constante.
Termino o ano a frisar a mesma mensagem-chave com que o iniciei: É urgente reconhecer o papel central dos enfermeiros na sustentabilidade do SNS e adotar políticas estruturais que assegurem a dignificação e valorização da profissão!
Lúcia Leite, Presidente da Associação Sindical Portuguesa dos Enfermeiros

