: 26 de Setembro, 2025 Redação:: Comentários: 0

A Mais Magazine teve o prazer de conversar com o Bastonário da Ordem dos Fisioterapeutas, António Lopes, que destacou a relevância da fisioterapia no acompanhamento de doentes em cuidados paliativos. Ao longo da entrevista, abordou a missão da Ordem, a importância da integração dos fisioterapeutas nestas equipas multidisciplinares, os principais desafios da prática, a necessidade de formação especializada e as perspetivas futuras para garantir que nenhum doente fique privado deste contributo essencial.

Qual a missão da Ordem dos Fisioterapeutas?

A Ordem dos Fisioterapeutas é a entidade reguladora da profissão, criada para garantir a defesa dos cidadãos. Tem como missão assegurar a qualidade do exercício profissional, regulando o acesso e promovendo o desenvolvimento científico, social e ético da Fisioterapia.

Como a Ordem dos Fisioterapeutas define e compreende os cuidados paliativos no contexto da fisioterapia? Como a fisioterapia pode ser uma ferramenta de ajuda importante para estes doentes?

Os Cuidados Paliativos requerem uma abordagem que privilegie o trabalho em equipa, o domínio do controlo de sintomas, a comunicação eficaz e o apoio à família. O Fisioterapeuta, integrado numa equipa interdisciplinar, projeta o seu trabalho com vista à maximização da qualidade de vida destes doentes e à diminuição dos vários domínios do sofrimento (físico, psicológico, espiritual e social). Assim, compreender o processo de cuidados ao doente e família, tanto no contexto comunitário como de internamento, torna-se fundamental. A Fisioterapia é uma ferramenta essencial na promoção da independência funcional, da autonomia e do conforto do doente em cuidados paliativos. Integrado na equipa interdisciplinar, o Fisioterapeuta desenvolve planos individualizados de intervenções para alívio da dor, gestão da fadiga, controlo da ansiedade e depressão, prevenção de complicações do acamamento e/ou imobilização. O Fisioterapeuta apoia ainda o doente/família a desenvolver estratégias de controlo sintomático e incentiva à valorização precoce desses sinais e sintomas, ajudando na sua gestão, ao longo de toda a trajetória da doença ou declínio da condição de saúde.

Existem orientações da Ordem quanto à formação em cuidados paliativos para fisioterapeutas?

Não existem ainda orientações específicas da Ordem. Contudo, existe um grupo de trabalho temático que integra esta área e que assegura a integração da Ordem num subgrupo internacional da World Physiotherapy – o International Physical Therapists for HIV/AIDS, Oncology, Hospice and Palliative Care, acompanhando as tendências e evolução no plano internacional. Paralelamente, muitos fisioterapeutas colaboram e frequentam cursos de formação avançada em cuidados paliativos em Portugal, tendo produzido estudos e publicado teses que dão suporte à evidência científica dos resultados da intervenção dos Fisioterapeutas nesta área.

Promovem cursos, formações ou eventos relacionados à temática dos cuidados paliativos?

A Ordem dos Fisioterapeutas está a desenvolver um sistema de avaliação e acreditação da formação pós-básica, que permitirá aferir a formação diferenciada em áreas específicas, como os cuidados paliativos. Este processo garantirá que os cidadãos sejam acompanhados por Fisioterapeutas devidamente qualificados, reforçando ainda mais a qualidade e a confiança nos cuidados prestados.

Quais são os principais desafios enfrentados pelos fisioterapeutas na prática dos cuidados paliativos?

O principal desafio está logo a montante da própria intervenção: a falta de acesso e de integração efetiva de Fisioterapeutas nas equipas de cuidados paliativos. De acordo com o Relatório de Outono de 2023, realizado pelo Observatório Português dos Cuidados Paliativos, existem atualmente 14 Fisioterapeutas a colaborar nestas equipas. A maioria (11) dos fisioterapeutas está integrada nas Equipas Comunitárias de Suporte em Cuidados Paliativos. Com base no relatório, não existe nenhum fisioterapeuta a exercer funções exclusivamente em cuidados paliativos e, nas Unidades de Cuidados Paliativos, os que estão alocados têm uma mediana de apenas 7 horas semanais. Apenas um profissional surge registado com uma alocação semanal de 14 horas. O desafio primordial será, portanto, o de criar as oportunidades para que os Fisioterapeutas possam cumprir o seu papel e dar um contributo efetivo às equipas de cuidados paliativos. No plano da intervenção, a comunicação é também um desafio. Em cuidados paliativos, comunicar é parte integrante do processo terapêutico: exige uma abordagem empática e holística ao doente e à família. O aporte pessoal e relacional que os pacientes acrescentam permite ao Fisioterapeuta definir objetivos personalizados, alinhados com as prioridades de cada pessoa, de modo a otimizar a qualidade de vida e viver plenamente até ao fim. Outro desafio prende-se com a formação: a preparação específica em cuidados paliativos ainda é pouco desenvolvida na formação inicial de Fisioterapeutas, exigindo uma aposta clara na base, além da formação pós-graduada e contínua. Por fim, destaca-se a tomada de decisão clínica e ética. Cabe a cada Fisioterapeuta assegurar que possui as competências necessárias para lidar com dilemas éticos que são inevitáveis nestes contextos.

A Ordem tem planos futuros relacionados à regulamentação, apoio ou promoção dos cuidados paliativos na fisioterapia?

Sim. Esta é uma área de atuação dos Fisioterapeutas prevista no Estatuto da Ordem e temos vindo a desenvolver esforços junto do Governo e dos Conselhos de Administração das Unidades Locais de Saúde para aumentar a acessibilidade aos cuidados prestados pelos Fisioterapeutas no Serviço Nacional de Saúde, nomeadamente no seio das equipas de cuidados continuados. Paralelamente, trabalhamos com as Instituições de Ensino Superior no sentido de melhorar a formação de base e pós-graduada neste domínio. No plano interno, a Ordem é apoiada pela atividade do grupo de trabalho temático já constituído, para acompanhar boas práticas e reforçar a integração da Fisioterapia nos cuidados paliativos. O futuro passa por garantir que nenhum doente em cuidados paliativos fique privado do contributo da Fisioterapia.