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Pontualidade, Conforto e Segurança: são as principais expectativas de quem utiliza diariamente os transportes ferroviários. Em entrevista à Mais Magazine, José Ramalho, diretor de engenharia da Siemens Mobility Portugal, destaca a importância de integrar um sistema de Operação Automática de Comboios (ATO, na sigla em inglês) sobre o standard europeu de controlo de comboios, o ETCS (European Train Control System em inglês). Esta solução inovadora, além de promover avanços ao nível da sustentabilidade, promete elevar a eficiência operacional e a capacidade da infraestrutura.

Mais ação: a revolução na ferrovia já começou

A importância de um sistema de transportes eficiente e resiliente é inquestionável, na medida em que é uma importante alavanca para o desenvolvimento económico e social de qualquer país. Numa altura em que o paradigma da mobilidade enfrenta transformações significativas, é essencial dar resposta às necessidades crescentes, caminhando para um futuro que exige uma mobilidade cada vez mais eficiente e descarbonizada.

Neste contexto, o transporte ferroviário é cada vez mais relevante, assumindo um papel central nas políticas de mobilidade, tanto a nível europeu como nacional. Não só por ser uma das formas mais sustentáveis de transporte de passageiros e de mercadorias – apresentando-se como alternativa ao rodoviário – mas também pela capacidade de dar resposta a desafios globais, como a crescente taxa de urbanização.

Segundo as previsões da Organização das Nações Unidas (ONU), em 2050 perto de 70 % da população mundial viverá em cidades, sendo que, na Europa se prevê um número ainda mais significativo, estimado em torno de 83%.

A estratégia de mobilidade sustentável e inteligente da União Europeia traça objetivos claros, entre os quais está a duplicação do número de comboios de alta velocidade até 2030 e a implementação da mobilidade automatizada em grande escala. São passos que serão cruciais para atingir os objetivos da União Europeia para o setor dos transportes, que incluem a redução das emissões de dióxido de carbono em 55% até 2030 e em 90% até 2050, em comparação com os níveis de 1990.

Para alcançar estes objetivos, é crucial continuar a apostar na modernização do setor ferroviário, otimizando as capacidades do mesmo, e caminhando para a construção de um sistema de transporte mais inteligente, inclusivo, seguro e resiliente. Neste sentido, a implementação de um sistema de Operação Automática de Comboios (ATO, na sigla em inglês) sobre o Sistema Europeu de Controlo de Comboios (ETCS, na sigla em inglês) é uma oportunidade que deve ser equacionada por todos os gestores de infraestruturas e operadores de transporte ferroviário.

A instalação do sistema ATO sobre o ETCS é uma solução inovadora, prevista na mais recente baseline das Especificações Técnicas de Interoperabilidade (ETIs) de 2023, também conhecida como Baseline 4, que prevê a operação automática de comboios em linhas ferroviárias existentes, maximizando a utilização das infraestruturas e aumentando a capacidade de transporte a par de uma otimização no consumo energético. Os benefícios que advêm da implementação desta solução são vários e vão desde os referidos ganhos de sustentabilidade a uma maior eficiência operacional, pontualidade e conforto.

O ATO permite que um comboio seja operado de forma automática através do controlo dos sistemas embarcados de tração e frenagem para uma operação otimizada, enquanto o sistema ETCS monitoriza o movimento do comboio e os limites de velocidade na via. Em termos concretos, o ATO sobre ETCS pode levar a um aumento de até 30% na capacidade, – uma vez que permite que os comboios operem com intervalos mais curtos – , uma redução de até 30% no consumo de energia e um aumento de até 15% na pontualidade, minimizando o impacto das perturbações e melhorando a satisfação dos passageiros. Estes benefícios foram demostrados na cidade de Hamburgo depois de a Siemens Mobility ter instalado o sistema há 2 anos e foram apresentados publicamente na última edição da Innotrans no passado mês de setembro.

Estes ganhos de eficiência e de capacidade operacional são possíveis pela flexibilidade destes sistemas em combinar o controlo automático de tração e frenagem dos comboios com a monitorização contínua dos movimentos e dos limites de velocidade, garantindo uma maior segurança e eficiência.

Esta solução representa uma vantagem significativa em relação a outros sistemas de controlo de comboios, sendo especificamente projetada para funcionar em conjunto com o ETCS, um padrão amplamente adotado na Europa e no Mundo para assegurar a interoperabilidade e a segurança das operações ferroviárias. Foi também desenhada para utilizar dados em tempo real, calculando o perfil de velocidade ideal para cada viagem e, dessa forma, otimizar o consumo de energia e reduzir os custos operacionais.

A maximização da eficiência destes sistemas pode ainda ser alcançada com a conectividade do ATO aos algoritmos avançados das aplicações TPS Live da Siemens, que possibilita a gestão de tráfego em tempo real e, por isso, permite uma otimização do fluxo de tráfego numa rápida resposta a conflitos ou eventos imprevistos que perturbem o normal desenrolar da circulação planeada de comboios.

Em comparação com sistemas de controlo de comboios mais antigos, esta solução oferece vantagens adicionais, traduzindo-se em custos mais baixos, que são possíveis devido à otimização do consumo de energia e à menor necessidade de intervenção manual.

Além dos ganhos evidentes em termos de maior eficiência operacional, a implementação do ATO sobre ETCS traz consigo um impacto económico significativo, que se reflete em diferentes áreas.

A capacidade de operar comboios em intervalos mais curtos, por exemplo, permite um aumento da capacidade nas linhas ferroviárias existentes, adiando ou protelando a necessidade de investimentos significativos em novas infraestruturas, resultando, por isso, numa melhor utilização dos ativos existentes e num retorno mais rápido sobre o investimento. A melhoria na pontualidade e confiabilidade dos comboios contribui também para uma melhoria na satisfação dos passageiros e, consequentemente, na atratividade e competitividade do transporte ferroviário face a outros modos de transporte.

Esta solução representa ainda uma oportunidade em termos de criação de emprego e desenvolvimento tecnológico neste setor.

Tudo isto tem um profundo impacto na vida dos cidadãos, permitindo-lhes usufruir de um serviço ferroviário com menores perturbações e logo maior pontualidade, aliada a um maior conforto com a segurança a que a ferrovia já nos habituou.

Com a capacidade do sistema de transporte ferroviário praticamente esgotada em determinadas zonas da Rede Ferroviária Nacional – e com a adoção de medidas que podem sobrecarregar ainda mais este setor –, a possibilidade de aumentar esta capacidade de transporte das linhas existentes por via da tecnologia é fundamental para a viabilidade a curto e médio prazo das operações ferroviárias.

Há mais de 119 anos em Portugal, a Siemens tem desempenhado um papel crucial na modernização das infraestruturas ferroviárias, contribuindo para que estas se tornem mais eficientes e sustentáveis. É dessa forma que queremos continuar a posicionarmo-nos, estando uma vez mais disponíveis para acompanhar o país nesta transformação.

Reflexo desse compromisso são as plataformas como a Signaling X, que apresentámos durante a InnoTrans 2024. Esta plataforma, baseada em tecnologia Cloud, permite a gestão e operação contínua de aplicações e sistemas de sinalização a partir de um único centro de dados de sinalização, possibilitando aos nossos clientes uma gestão mais eficiente e flexível.

Soluções como o ATO sobre ETCS ou a Signaling X são, sem dúvida, importan-www.mobility.siemens.comtes para a ferrovia do futuro, que já co-meça a ganhar forma em toda a Europa. O projeto pioneiro nas linhas S2 e S21 da S-Bahn em Hamburgo é um exemplo concreto do que é possível alcançar com esta solução. No seguimento de uma parceria de colaboração com a Deutsche Bahn, para alavancar a digitalização da ferrovia alemã, a Siemens Mobility implementou o standard europeu ATO sobre ETCS, permitindo a circulação do primeiro comboio autónomo no país, num troço de 23 quilómetros das referidas linhas.

Estamos preparados para, também em Portugal, onde já existem alguns troços com ETCS em fase de implementação, ajudar nesta transição. Mas para tal é necessário que, enquanto país, exista disponibilidade e visão a longo-prazo, pois a implementação de soluções como o ATO sobre ETCS não é isenta de desafios.

Entre os principais está a integração destas soluções com as infraestruturas existentes. Para suportar a tecnologia ATO, tanto o material circulante como as linhas ferroviárias precisam de ser adaptadas, o que pressupõe atualizações na sinalização e nos sistemas de controlo de tráfego. A compatibilidade com diferentes sistemas é outro desafio, que só poderá ser superado com a padronização através do ETCS, de modo a permitir uma operação harmoniosa e segura em redes ferroviárias internacionais, a tão falada Interoperabilidade.

Mais do que nunca, é necessário focar nas oportunidades, que são significativas, criando condições e desburocratizando processos para superar os desafios da implementação destas tecnologias. Uma ferrovia robusta é essencial para uma maior coesão territorial, que tem significativos impactos económicos e sociais.

A Siemens Mobility está preparada para acompanhar os gestores de infraestruturas e os operadores ferroviários nesta transformação, sobretudo numa altura em que se traça também o futuro dos comboios de Alta Velocidade no país. Enquanto parceiros duradouros, estamos comprometidos em contribuir para a construção de cidades inteligentes e para a mobilidade do futuro, estando cientes de que, com contínua inovação, o futuro do transporte ferroviário promete ser mais brilhante e sustentável.

José Ramalho, Diretor de Engenharia da Siemens Mobility Portugal