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“A saúde mental de uma população não depende apenas da qualidade dos seus serviços de saúde. Se fosse apenas isso era mais fácil: bastava investir o suficiente nos serviços de saúde de mental e o problema ficava resolvido”, afirma o coordenador nacional das Políticas de Saúde Mental, em entrevista à Mais Magazine.

O coordenador nacional das Políticas de Saúde Mental e professor catedrático de Psiquiatria e Saúde Mental, Professor Doutor Miguel Xavier, defende a necessidade de uma “intervenção integrada”, em que a saúde mental esteja presente “em todas as políticas” do país. Em análise está o facto de Portugal aparecer frequentemente nos últimos lugares dos níveis de bem-estar da população.

Para Miguel Xavier a explicação para este fenómeno não é desconhecida: “Os determinantes do bem-estar não são apenas os relacionados com a saúde. São determinantes que têm a ver muitas vezes, e fundamentalmente, com as condições socioeconómicas das pessoas”.

O coordenador nacional da Políticas de Saúde Mental defende assim a necessidade urgente de uma ação “a montante”, capaz de intervir na base deste problema. “Temos de intervir naquilo que são as condições de vida das pessoas, as condições socioeconómicas, laborais e educacionais. A saúde mental tem de estar incluída nas políticas todas. Não apenas nas políticas do Ministério da Saúde, mas também, e pelo menos, nas políticas do Ministério da Educação e do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social. Por isso é que, a Organização Mundial de Saúde tem como lema ‘Saúde Mental em todas as políticas’”.

A par disso, Miguel Xavier reforça ainda a importância da promoção da saúde e da prevenção da doença, sobretudo, em ambiente laboral e educacional. “A literacia e prevenção, esta através da deteção precoce de situações de risco, são fundamentais. Não podemos ter um mundo de trabalho com condições que levam muitas vezes ao burnout e esperar que essa população tenha uma boa saúde mental. E na escola acontece a mesma coisa, porque é nela que se faz a prevenção das situações. As escolas têm de perder o estigma e começar a abordar a saúde mental nos seus programas. Para além disso, deve haver apoio psicológico nas escolas, que possibilite a deteção precoce de situações de risco”, alerta.

Apesar de nos últimos 20 anos a saúde mental nunca ter sido considerada uma prioridade de investimento por parte dos Governos, o coordenador nacional das Políticas de Saúde Mental considera que o país está a atravessar uma fase “muito promissora”. “Em primeiro lugar, o estigma da saúde mental está gradualmente a baixar. Em segundo, muito graças à Covid-19, há uma maior sensibilização da opinião pública para as questões da saúde mental. E em terceiro lugar, está uma reforma da saúde mental em curso, com um apoio político sólido, que esperamos que esteja concluída em 2026”.

Não obstante os bons indicadores, Miguel Xavier reforça ainda a importância de “um aumento progressivo do investimento financeiro na saúde mental”. “A saúde mental só agora está a ser considerada uma prioridade. Acho que estamos numa fase promissora e estou otimista em relação a esta situação. É claro que ainda há dificuldades, nomeadamente, no acesso das pessoas aos cuidados, mas isso é um resultado do que não se investiu durante décadas. Agora, temos é de arranjar maneiras de, no mais curto espaço de tempo possível, começar a diminuir estas dificuldades”.